29 de abr. de 2017

FALECE CLAUDIOMAR: O ÚLTIMO DOS MOICANOS

Por Prof. José Antônio Albuquerque

A morte de Claudiomar Matias Rolim, aos 62 anos de idade, ocorrida hoje na cidade São Luís, capital do Maranhão, causada por um infarto fulminante, pegou a todos nós de surpresa.

Claudiomar tinha uma paixão sem medida por sua sempre amada e inesquecível cidade de Cajazeiras, onde nasceu em 10 de dezembro de 1954. Era formado em Economia pela Escola Superior de Economia e Negócios de El Salvador e atualmente era corretor de imóveis e construtor em São Luís. 

Claudiomar Matias Rolim

Era filho do ex-prefeito de Cajazeiras, Francisco Matias Rolim e de Dona Teresa Augusto Rolim e tinha mais duas irmãs: Ana Cleide, Assistente Social e reside na cidade de João Pessoa e Ana Célia, Médica Veterinária e reside em São Luís.

Claudiomar era casado com Irene Rolim e deixou três filhos: Claudiomar Rolim Filho, formado em Relações Internacionais, pela Universidade de Brasília, é gestor público e sua grande paixão é viajar pelo mundo e autor do livro “O mundo numa Mochila”; Caio Augusto e Claudio Augusto ambos moram em São Paulo.

Claudiomar externava todo o seu amor por Cajazeiras através de seu blog “O Último dos Moicanos”, onde postava diariamente notícias sobre tudo que se relacionava à Cajazeiras e seus filhos.

Deixa uma lacuna enorme entre nós e é mais um filho da terra que migrou sem retirar as suas raízes do solo cajazeirense e que sempre vinha beber na fonte sagrada das águas do Açude Grande. A sua presença era constante, principalmente em função da assistência que vinha prestar ao seu pai que já ultrapassou os noventa anos de vida.

Seu corpo será transladado para Cajazeiras e será sepultado no Cemitério Coração de Maria, no mesmo túmulo do seu primo-irmão Valiomar Matias, que morreu também muito jovem vítima de enfarto.

Enviado pelo professor, escritor, pesquisador do cangaço e gonzaguiano José Romero de Araújo Cardoso

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28 de abr. de 2017

MISSA DE 7º DIA DE MILTON MARQUES DE MEDEIROS

Milton faleceu no último sábado (Foto: cedida)

A família do empresário Milton Marques de Medeiros, agradecida pela solidariedade dos mossoroenses, convida para a missa de sétimo dia de seu falecimento. A missa acontecerá  (hoje) nesta sexta-feira, 28 de abril, às 17 horas, na Catedral de Santa Luzia.
Que a fé que nos une seja sempre viva.

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27 de abr. de 2017

IGREJA DO ROSÁRIO SERRA TALHADA - PE

Por Voltaseca
FOTO: Fonte Google.

A Família Ferreira (José Ferreira e os filhos, Virgulino (futuro Lampião) e a venda de peças de couro em Vila Bela (atual Serra Talhada-PE), em frente ao pátio da IGREJA DO ROSÁRIO... (vide, acima, foto atual do local).

A aludida Família era exímia na confecção de peças de couro (selas; bornais, cintos, cilha... etc.) e, o velho José Ferreira junto com os filhos (Antônio, Virgulino, Livino...) as vendia nas feiras livres da região do Pajeú, sobretudo em Vila Bela, Triunfo e demais cidades da região.

A antiga igreja do Rosário, ainda, continua lá no local, como se fosse uma testemunha ocular dessa história. 

Atualmente, o local denomina-se PRAÇA AGAMENON MAGALHÃES, em homenagem ao famoso filho ilustre que brilhou na política pernambucana. 

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24 de abr. de 2017

POSSE DO PROFESSOR BENEDITO VASCONCELOS MENDES NA ANRL


Enviado pelo professor, escritor, pesquisador do cangaço e gonzaguiano José Romero de Araújo Cardoso

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23 de abr. de 2017

ZÉ GONZAGA - ENCONTRO COM LAMPIÃO

https://www.youtube.com/watch?v=4URj5kB-izw

Publicado em 27 de jan de 2014
Autoria: Zé Praxedes e Zé Gonzaga
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O CANGAÇO NO BRASIL.

Por Genilson Alves da Silva
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Introdução

A história é uma cocha de retalho cada pedaço se completa e dar novo espaço e nova tonalidade para aquilo que se quer construir. Pois queremos trazer questionamentos e soluções e não só questionar o poder público e a forma de fazer política daquela época, e sim entender cada indivíduo no seu espaço e lugar esse é o papel do historiador sendo meramente imparcial naquilo que busca. O cangaço surgiu entre o final do século XIX e começo do XX (início da república O período que vai de 1889 a 1930 que é conhecido como a República Velha). Surgiu, no Nordeste Brasileiro, grupos de homens armados conhecidos como cangaceiros. Estes grupos apareceram em função, principalmente, das péssimas condições sociais da região nordestina. O latifúndio, que concentrava terra e renda nas mãos dos fazendeiros, deixava às margens da sociedade a maioria da população, sem contar que os oprimiam. Se não já bastasse a seca predominante na região nordeste, as cargas de impostos altíssimas que assolava o povo sertanejo. 

A palavra cangaço tem um significado bastante expressivo no meio rural, como podemos observar que essa palavra vem da palavra = canga (peça de madeira usada para prender junta de bois a carro ou arado; jugo).  Que serviria para ara a terra ou fazer outros tipos de atividades. Podemos observar que a canga que é para serem colocadas em animais. Mas estavam sendo colocadas na população pobre, literalmente estava sendo colocadas nas costas da população brasileira e especial na região nordeste a exploração, era clara de si ver, com a seca, fome e sem contar pelos altíssimos impostos cobrados pelo governo brasileiro aos seus co-cidadãos. Os mais prejudicados eram os sertanejos. O governo sempre colocou a sua canga nas costas do povo e contínua.

Para entendermos melhor a cronologia histórica dos fatos, que a parti disso o governo federal coligado ao governo de Acioly no Ceará que era extremamente ligado ao padre Cicero Romão Batista. O mesmo comunicou o interesse do então presidente da república velha de querer acabar com o Carlos Prestes, convidando Virgulino a ser capitão do exército aqui no Nordeste brasileiro. A Coluna Prestes foi um movimento político, liderado por militares, contrário ao governo da República Velha e às elites agrárias. Este movimento ocorreu entre os anos de 1925 e 1927. Teve este nome, pois um dos líderes do movimento foi o capitão Luís Carlos Prestes.  Ele (Lampião) ganharia a patente de capitão, dinheiro, armas e muita munição, com o objetivo de acabar com a Coluna Prestes, mas isso nunca ocorreu. Com isso oficializou as ações de Lampião na sua atividade de justiceiro. Ele nunca ficou de frente com a Coluna de Carlos Preste. Utilizou tudo que ganhou em favor de seus próprios interesses, passando a sim a ser o senhor dos sertões. Ou melhor, governador dos sertões nordestinos, Lampião.

Continua...

O destemido por todos. ‘’Aqui ainda Lampião não era conhecido por suas ações. O governo do presidente Artur Bernardes, sendo presidente do Brasil, esse embate de discursos levou a um processo representacional que propiciou a oscilação da imagem de Lampião de bandido sanguinário a um exímio patriota, adepto das armas para extirpar do solo nacional a “erva daninha” – a Coluna Prestes. Daí então o  que contou com a participação do governo nordestino como principal financiador.

O cangaço se caracterizou por ter como principal líder Lampião (Virgulino Ferreira da Silva). Os cangaceiros eram homens que andavam pelas cidades em busca de fazer justiça e de vingança. A falta de emprego também foi o que motivou a essa pratica do cangaço, da mesma forma alimentos que eram bastante escarço e a cidadania que não era respeitada nem pelos cangaceiros e nem tão pouco pelo governo.  Motivações essas que saiu causando o desordenamento da rotina dos camponeses. Por exemplo: Motivo da pratica do cangaço:
Alimentos que eram bastante escarço.

Desemprego. 

Fome.

A cidadania que não era  respeitados nem pelo governo e nem tao pouco  pelos cangaceiros. 

Impostos altíssimos.

A seca.

Estilo próprio de se vestir,

•          Os cangaceiros usavam roupas e chapéus de couro, portanto Entender o cangaço, é entender a forma que cada um  dos sertanejos foram obrigados a viver  com a realidade daquela época. Uns permaneceram em suas propriedades trabalhando para os coronéis, outros se debandaram nos bandos do cangaço. Portanto, podemos entender o cangaço como um fenômeno social, caracterizado por atitudes violentas por parte dos cangaceiros, por parte das volantes. (Polícia militar hoje.) Estes, que andavam em bandos armados, espalhavam o medo e o terror pelo sertão nordestino. Os cangaceiros promoviam saques a fazendas, atacavam comboios e chegavam a sequestrar fazendeiros para obtenção de resgates.

Aqueles que respeitavam e acatavam as ordens dos cangaceiros não sofriam mal algum, pelo contrário, eram muitas vezes ajudados. Esta atitude, fez com que os cangaceiros fossem respeitados e até mesmo admirados por parte da população da época. Os cangaceiros não moravam em locais fixos. Possuíam uma vida nômade, ou seja, viviam em movimento, indo de uma cidade para outra sempre pela a caatinga para não serem vistos pela volante. Ao chegarem às cidades pediam recursos e ajuda aos moradores locais. Aos que se recusavam a ajudar o bando, sobrava à violência. Como não seguiam as leis estabelecidas pelo governo, eram perseguidos constantemente pelos policiais (volantes). Usavam roupas e chapéus de couro para protegerem os corpos, durante as fugas, pela vegetação cheia de espinhos e galhos secos da caatinga. Além desse recurso da vestimenta, usavam todos os conhecimentos que possuíam sobre o território nordestino (fontes de água, ervas, tipos de solo e vegetação) para fugirem ou obterem esconderijos. O cangaço tinha a sua própria definição, regras. Como, os cangaceiros eram homens que andavam armados e em bandos pelo sertão nordestino nas primeiras décadas do século XX.Tinham suas próprias regras de conduta e suas próprias leis. Vagavam de um local para o outro (não possuíam residência fixa), vivendo de saques e doações. Eles eram temidos pelas pessoas e espalhavam o medo por onde passavam. Frequentemente enfrentavam as forças policiais do governo. Também tinham um estilo próprio de se vestir, de acordo com a época e a região que viviam, ou seja, que estavam inseridos. Os cangaceiros usavam roupas e chapéus de couro, pois andavam muito pela catinga. Este tipo de vegetação possui muitos espinhos e esta roupa fornecia proteção aos cangaceiros. Aqui não podemos deixar de falar que eles também tinham o seus líderes e que havia vários bandos, entre eles o que se destaca entre é o de Virgulino Ferreira da Silva. (o lampião).

1.            Contextualizando e Entendendo os Fatos ocorridos no Cangaço
Segundo a Pesquisadora da Fundação Joaquim Nabuco a Sr.ª Semira Adler Vainsencher,  relata em sua pesquisa que, ‘’ Virgulino Ferreira da Silva nasceu no dia 7 de julho de 1897, na Fazenda Ingazeira, situada no município de Vila Bela (hoje, Serra Talhada), no sertão de Pernambuco. Foi o segundo filho de José Ferreira da Silva e de Maria Selena da Purificação. O seu nascimento, porém, só é registrado no dia 7 de agosto de 1900. Tinha como irmãos: Antônio, João, Levino, Ezequiel, Angélica, Virtuosa, Maria e Amália. Todos cresceram ouvindo e/ou presenciando estórias de cangaceiros, e Antônio Silvino lhes serve de exemplo maior.  Naquela época, o sertão quase não possuía escolas e estradas, viajava-se a pé, a cavalo, em burro e em jumento.   Dizer que os denominados coronéis (os proprietários de terras) imperavam sob o peso da prepotência como os verdadeiros chefes políticos, sem nunca sofrer represálias porque a força do Estado estava sempre do seu lado.

Neste sentido, eram eles que davam a palavra final, ou seja, elegiam, destituíam, perseguiam, condenavam, absolviam, torturavam e matavam. Em períodos de crises econômicas, os coronéis recebiam ajuda do Poder Público. Isto era uma recompensa, um benefício recebido, por causa dos eleitores que controlavam mediante os "votos de cabresto" - aqueles votos fornecidos a um candidato, e garantidos pela palavra-de-ordem dos poderosos, que impõem nomeações e asseguram a hegemonia da classe política local, sem se importar com a competência profissional dos nomeados.

Vale ressaltar que diante de todas as dificuldades imposta pelo sistema daquela época a família de lampião era muito simples e trabalhadores certo que, Ele apesar de muito inteligente, Virgulino abandona a escola para ajudar a família no plantio da roça e na criação de gado. Ele trabalhou com o pai, na infância e parte da adolescência, cuidando de gado, com transporte de mercadorias em longa distância, utilizando burros como meio de transporte de carga. Trabalhou até os 20 anos de idade, como artesão. Torna-se famoso nas vaquejadas. Gosta muito de dançar, de tocar sanfona, compõe versos e adora um rifle. Sabe costurar muito bem em pano e couro e confecciona as próprias roupas.  

Ele tinha 19 anos quando entrou para o cangaço. Dizem que tudo começou através de disputas com José Saturnino, membro da família Nogueira e vizinha de terras. Lutando contra essa família durante muitos anos, Virgulino e seus irmãos já se comportavam como futuros cangaceiros, não tardando a entrar em conflito com a polícia. A decisão de viver e morrer como bandido, contudo, só foi tomada, mesmo, quando a polícia mata José Ferreira da Silva - o patriarca da família - enquanto ele debulhava milho. Disse Virgulino: "vou matar até morrer" – prometeu ele, cheio de ódio e desejo de vingança. E assim agiu por quase três décadas. Em uma das primeiras lutas do bando, na escuridão da noite, Antônio (um dos irmãos Ferreira), espantado com o poder de fogo do rifle de Virgulino, que expelia balas sem parar e mais parecia uma tocha acesa, gritou o seguinte: Espia Levino! O rifle de Virgulino virou um lampião! A partir desse dia, a alcunha do famoso cangaceiro passa a ser Lampião. Aqui podemos perceber que os cangaceiros não moravam em locais fixos. Possuíam uma vida nômade, ou seja, viviam em movimento, indo de uma cidade para outra.

Ao chegarem às cidades pediam recursos e ajuda aos moradores locais. Aos que se recusavam a ajudar o bando, sobrava à violência.  Atuou em sete Estados Bahia, Sergipe, Pernambuco, Alagoas, Paraíba, Ceará e Rio Grande do Norte,  com fama de semear o  terror e a morte no sertão.  São famosos os fracassos dos  “macacos” do governo federal nas operações preparadas para capturá-lo e as o gradativo aumento do oferecimento de  recompensas  a quem o matasse,  aumentavam sua fama. Admirado pela sua valentia e ousadia, acabou convertido em herói.  Neste contexto surge Lampião, que subverteu a ordem imposta, mesmo que não fosse esse seu objetivo. Lutou contra os Latifundiários que por 4 séculos imaginavam-se intocáveis, passaram a ter medo de sua presença e o terror das consequências do não atendimento de suas exigências. 

Virgulino consegue realizar seu maior sonho, com a intermediação do Padre Cícero Romão Batista: adquirir a patente de capitão, no Batalhão Patriótico do deputado Floro Bartolomeu, o batalhão das forças legais. Além de alimentar sua vaidade pessoal, a patente funcionaria como uma espécie de salvo-conduto, permitindo o bando circular pelas divisas dos estados do Nordeste. Aproveitando aquela oportunidade, Virgulino solicita, também, para os companheiros Antônio Ferreira e Sabino Barbosa de Melo, os postos de 1o. e 2o. Tenentes. Acatada a solicitação, os membros do bando abandonam as roupas costumeiras, vestem a farda de soldado e, como autoridades constituídas, passam a ter o dever - por mais irônico que isto possa soar -, de defender a legalidade e proteger a população nordestina. Tudo isso foi redigido pelo Padre Cícero e assinado, a pedido deste, no dia 12 de abril de 1926, pelo engenheiro-agrônomo do Ministério da Agricultura, Dr. Pedro de Albuquerque Uchoa. Feliz da vida aos 28 anos de idade, o jovem Capitão Virgulino reúne a família para tirar fotografias.

Oficialmente, ele recebe a missão de combater a Coluna Prestes - A Coluna Prestes foi um movimento político, liderado por militares, contrário ao governo da República Velha e às elites agrárias. Este movimento ocorreu entre os anos de 1925 e 1927. Teve este nome, pois um dos líderes do movimento foi o capitão Luís Carlos Prestes grupo que vinha percorrendo o País durante o governo do presidente Artur Bernardes. No entanto, após se distanciar uns 6 quilômetros de Juazeiro, Lampião decide se embrenhar na caatinga, em busca de combates mais lucrativos, deixando para trás o prometido a Padre Cícero e as responsabilidades para com o Estado. E os soldados do governo foram chamados de "macacos", porque saíam pulando quando avistavam os cangaceiros.

Segundo Rui Facó (1936) no livro cangaceiros e fanáticos, na página, 48 no 3ºcapitulo, no 1º parágrafo, faz referência ao cangaceiros e diz:  -  num meio em que tudo lhe é adverso, podia o homem do campo permanecer inerte, passivo, cruzar os braços diante de uma ordem de coisas que se esboroa sobre ele? No 2º parágrafo, Euclides da cunha já compreendera que “o homem do sertão [...] esta em função direta da terra’’ (p.141). Se a terra é para ele inacessível, ou se quando possui uma nesga de chão vê-se atenazado pelo domínio do latifúndio oceânico, devorador de todas as suas energias, monopolizadoras de todos os privilégios, ditador das piores torpezas, que fazer, senão revoltar-se?  Pega em armas, sem objetivos claros sem rumos certos apenas para sobreviver no meio que é o seu.

Dando continuidade ao pensamento de Rui Facó ele no 3º parágrafo diz que, então espantados   os homens das classes dominantes não sabem explicar por que ele se revoltou.  Ele, sempre cordato e humilde mesmo, que não falava ao senhor sem tirar da cabeça o largo chapéu de palha ou de couro, toma de uma arma, tornar-se um cangaceiro, arregimenta companheiros de infortúnio e forma um grupo - um bando. Por quê?

Já na página 49 dando continuidade ao 4º parag. Da página 48, Nina Rodrigues a firmava que ‘’a criminalidade do mestiço brasileiro [está] as mas condições antropológicas da mestiçagem no Brasil‘’.(1957,P. 158). Vários autores nordestinos, sem dar atenção às causas econômicas e sociais, recorrem as explicações para eles as mais fáceis, adotada por um cientista, a mestiçagem constituía um fato irremovível, seus resultados no Nordeste – o cangaço e fenômenos correlatos – jamais teriam remédios. Na pág. 49, parag. 2º  segundo o autor , diz  que é interessante  observar  como até  mesmo conhecedores  da  situação local,  homens nascidos  e criados ali, narram fatos  e episódios diante  dos quais  se supõe  que tirarão  as conclusões  logicas ,  e no entanto  a conclusão  é contraria  à própria  realidade descrita .  é o caso , entre  outros ,  de Xavier de oliveira, filho do cariri. Reconhece ele textualmente: ‘’ o homem honesto e trabalhador  de outrora é um  bandido agora, por causa de uma questão  de terra,’’(1920, p. 24). Acrescentava quanto as condições de trabalho: no cariri. Em certa cidade, há o que se chama feira de trabalhadores. Centenas de homens, reunidos em praça pública, enxada no ombro, prontos para o trabalho. Chega o fazendeiro, escolhe o mais robusto (é como  se escolhesse bois  para o corte) e os leva  a roça .  Os outros, em número de centenas, ficam sem trabalhar, sem comer, eles e suas mulheres  e seus filhos’’(ibid. ,. P ,28-29).

Estes homens é a conclusão lógica tinham forçosamente que ser revoltados. sem terra, sem ocupação certa a mais brutal  exploração  de seu trabalho, revoltar - se -  iam qualquer que fosse  a dosagem   de seu sangue, sua origem racial,  o meio físico que  atuasse  sobre  seu organismo. Mas  o simples efeito  de causa  o autor vem apontar neste  1ºparag. Da pág. 51  onde continua dizendo que  as causas profundas:  de tudo isso a ausência da justiça,  analfabetismo, precariedade de comunicações  e transportes, baixos  salários – quando  tudo isto  já  resultava da tremenda desigualdade social,  do débil desenvolvimento do capitalismo, do lentíssimo incremento das forças  produtivas, da concentração da propriedade da terra,  que dava  poder  econômico ilimitado a uma insignificante minoria  da latifundiários.  A grande  massa dos  habitantes  da região  não dispunha de  recursos normais  para viver, nem mesmo  tinha  a possibilidade  de vender com segurança  sua força de trabalho.

Quando conseguia, era em condições  tais que  correspondiam  à semi–servidão.  Como  poderia  haver justiça, simples  recursos jurídicos, sem falar em  justiça social, para  explorados  e oprimidos  em  tais  condições ?   o aparelho da judiciário estava  sob o controle direto dos  sobas locais, os juiz lhe  era um dependente, muitas vezes menos do que  isso, um lado. Diz Xavier de oliveira, em 1919: No sertão não há lei, não há direitos, não  há justiça[...] Quanta vez,  ali, não é removido, de uma para outra comarca, um juiz que proferiu uma sentença contra um político,  Influente , cabo eleitoral ou chefe de bando do presidente ou do governador do estado?  Oliveira,  1932, p. 22 . E narra episódios  de demarcações de terras mandadas fazer por  certo magistrado sob uma chefia  local, e desfazia pelo mesmo magistrado quando  o município se encontrava  sob outro governo.) Segundo o autor Rui Facó   parag. 2º da pag. 52 diz: como poderia, pois haver alfabetização, instrução, educação popular? Além disso, para que? O interesse do grande proprietário de terra é manter no lado obscuro a população local.  Ele quer braços servis e não cabeças que pensem. Ninguém necessita de saber ler e escrever para pegar numa enxada.  O bolso dos potentados local.  O governo do estado ou do município não dispunha de verbas para gastar  com escolas . As verbas iam para os bolsos dos potentados locais,  Seus familiares e parentes. Mesmo que fundassem escolas uma ou duas na sede do município, para os filhos dos ricos ou remediados, os filhos dos pobres não podia frequentá-las. Para os pobres segundo Rui Faco eram  privados de comprar certos matérias, coisas elementares, como por exemplo: um par de sapato ou uma roupa.

Quanto mais livros  e material escolar. E quando seus pais tinham trabalhos garantidos  ou um lote de terra eles teriam que ajudar desde o mais velho ao mais novo , todos. Enfrentar os duros labores da terra.

Quanto aos meios de comunicação e transporte, como poderiam existir se o latifundiário era o feudo quase fechado, se  pouco produzia  ou produzia  apenas  para o consumo familiar  ou local? Os meios de transporte comuns eram os animais, o lombo do  burro ou o carro de boi, que passavam por  quaisquer caminho  qualquer  picada no campo. Ainda hoje  muitos acreditam  que foram  simplesmente as  estradas, o caminhão, que acabaram   com o cangaço. Esquecem  os jagunços  de floro Bartolomeu foram conduzidos de trem  de Iguatu a  fortaleza, que lampião  viajou  com seu bando em caminhões  e ocupou cidades servidas de telégrafo.

No entanto um bom conhecedor do nordeste e lúcido estudioso de seus  problemas sociais  repetia nos anos,  de 1920, que ‘’a repressão [ ao cangaceirismo]  é neste   extenso território  um problema  de fácil  transporte ‘’( Almeida, 1937).segundo o autor Faco  no 1º parág. da pág. 53 na linha 9º  diz: desenvolvem-se, bem  ou mal  as forças produtivas, e esse desenvolvimento, embora lentíssimo, é que constitui a força motriz  das transformações  operadas que atingem  o meio social. Não é que a estrada e o caminhão espantem  o cangaceiro. A estrada e o caminhão  trazem  para a cidade o cangaceiro de amanhã.

A indústria o entrosa em suas engrenagens, os próprios meios de transporte o absorvem   ou o conduzem para os novos cafezais que  se abrem  no norte do Paraná. A estrada  e o caminhão   já resultavam, eles mesmos, daquela mudança.  Por que não é só no monopólio da propriedade fundiária  que reside a matriz do cangaço; é em todo o atraso econômico. No isolamento do meio rural,  no imobilismo social, na ausência  de iniciativas outras  que não  fossem  as do latifundiário e as   deste eram quase nenhuma. Pode-se imaginar  o que  representou como fator de comoção  interna no cariri o surgimento de uma  cidade cuja  população  nos primeiros  vinte anos  de seu nascimento era maior  do que  a de meia dúzia  das cidades clássicas  do vale, como  aconteceu em juazeiro. Era  uma subversão para o latifúndio nordestino.

Segundo o  autor ele chama a atenção  dessa verdade que compartilha com todos nós hoje quando ele diz:  tem-se  opinado também  que o cangaceirismo  advinha  da ausência  de policiamento nas regiões interioranas profundas.  Segundo  Faco,  ele deixa bem claro que todos os fatos   provam  o contrário : quando a polícia apareceu  para combater  o cangaço, teve  o mérito de exacerba-lo. Por todo  este interior  do brasil, onde  quer  que a polícia tenha chegado  para perseguir cangaceiros ou ‘’fanáticos‘, praticou  contra as populações rurais  crimes  mais hediondos  do que os cangaceiros mais sanguinários. A primeira coisa que fez foi colocar-se incondicionalmente a serviço de um  dos potentados locais , a serviço portanto de suas intrigas , seus ódios , suas perseguições.

Não se compreendia, ou não se queria compreender, pois que interesses  materiais  dos mais abjeto egoísmo  não o permitiam, que havia aquela  convulsão, abrangendo  tão grandes massas humanas por todo o nordeste  e não só no nordeste é que  deviam existir necessidades sociais  que as instituições  entorpecidas não podiam satisfazer. Não se tratava de crimes individuais  não  era portanto um crime , mas um problema social a enfrentar. Não é ainda a revolução social, mas são  o seu prologo.  São os elementos regenerados daquela sociedade estagnada, em processo de putrefação. Revivem-na,  dão-lhe sangue novo, põem-na em movimento, preparam-na para o advento de uma nova época. São ainda elemento unificador por excelência de uma região mais do que o nordeste, todo um imenso território interiorano que se  desagregava, dentro de si mesma, em feudos quase fechados e paralisados. Não era ainda uma luta diretamente pela terra, mas  era uma luta em função  da terra uma luta  contra o domínio do latifúndio semifeudal.

Segundo foco na pag. 56, nesse 3º cap. Diz os bandos de cangaceiros que saem  dentre  aqueles  semi-servos vivem dispersos,  lutam por objetivos isolados e, não  raro, enfrentam-se  uns aos outros, destroem-se mutuamente . Tornam-se presas de seus  próprios  inimigos de classe, os grandes  proprietários rurais, donos  de fazendas  de gado ou de lavras de minérios.  No surgimento e o incremento do cangaço são  a primeira réplica  ruína e a decadência  do latifúndios semifeudal, de que também são resultante.

Naquela sociedade primitiva, com aspectos  quase medievais semibárbaros, em que  o poder do grande proprietário era incontestável, até mesmo uma forma de rebelião  primaria, como era o cangaceirismo, representava  um passo à frente para  a emancipação dos pobres  do campo. Constituía um exemplo de insubmissão. Era um estímulo as lutas. O cangaço precede os grandes ajuntamentos de ‘’fanáticos ‘’que tiveram  seus pontos culminantes em canudos e no contestado.

No bando de  Lampião tinha indivíduos de todos os tipos: gordos, magros, ruivos, louros, morenos, altos, baixos, negros e caboclos. Alguns, inclusive, eram jovens demais: Volta Seca (11 anos), Criança (15 anos), Oliveira (16 anos). O mais idoso era Pai Velho, com 71 anos de idade. Lampião arranjava, facilmente, armamentos e munições, mas, como o fazia, era um segredo que não contava a ninguém. Uma parte das armas automáticas, para combater a Coluna Prestes, foi adquirida através do Deputado Floro Bartolomeu e do Padre Cícero. Os demais armamentos do bando foram arranjados mediante a intervenção de amigos.

Um acidente provocado pela ponta de um pau cega o olho direito do Capitão Virgulino, um órgão (olho), que, anteriormente, já se apresentava problemático devido à presença de um glaucoma. Enxergando com um olho, apenas, Lampião se vê obrigado a ficar sempre enxugando, com um lenço, as lágrimas que pingam do olho vazado. A despeito dessa deficiência, ele nunca deixou de ser um excelente estrategista. Dizem que foi uma brincadeira de mau gosto da família Ferreira (o corte da cauda de alguns animais) a gota d’água que desencadeou uma afronta irreparável com o fazendeiro José Saturnino, proprietário das terras vizinhas e membro da família Nogueira. Sendo mais numerosos e tendo o apoio do governo, essa família termina por expulsar os Ferreira de suas terras.

A partir de 1917, Virgulino e a sua família passam a conviver com intensos tiroteios e emboscadas, não podendo morar em um lugar específico: são obrigados a vagar pelo sertão e levar uma vida de nômades. Em meio às lutas e fugas, falece Dona Maria Selena, no Engenho Velho. E, no início de agosto de 1920, o patriarca da família - José Ferreira - é fuzilado pela volante do sargento José Lucena, enquanto debulhava milho. Naquele mesmo dia, então, os Ferreira fazem um juramento: o seu luto, até a morte, iria ser o rifle, a cartucheira e os tiroteios.

Quando sabia da existência de um coronel perverso, Lampião não perdia a oportunidade de queimar-lhe as fazendas e matar-lhe o gado. Nas incursões em vilas e povoados, o grupo saqueava, dizimava e matava. As violências cometidas pelo bando eram inúmeras: tatuagem a fogo, corte de orelha ou de língua, castração, estupro, morte lenta, entre outras. Muitos habitantes abandonavam definitivamente as suas propriedades, tornando desertas as caatingas, já que elas estavam entregues a soldados e cangaceiros. Virgulino Ferreira era bastante impulsivo.

Às vezes, passavam-se meses sem se ouvir falar nele, pensando-se, inclusive, que tinha morrido. Mas, de repente, ele surgia do nada com o seu bando, como um tremendo furacão, lutando contra as volantes, incendiando fazendas, roubando e matando com a maior naturalidade. Em algumas ocasiões, seus gestos eram generosos: confraternizava com as pessoas, organizava festas, distribuía dinheiro, pagava bebida para todos. Em uma de suas paradas para descansar, perto da Cachoeira de Paulo Afonso, conheceu Maria Deia, filha de um fazendeiro de Jeremoabo, na Bahia. Há cinco anos ela era casada com José de Neném - um comerciante da região - mas nutria uma paixão platônica por Lampião, mesmo sem nunca o ter encontrado.

Alguns afirmam que foi a própria mãe de Maria Deia que segredou a Lampião sobre essa paixão. Já outros dizem que foi Luís Pedro - integrante do bando - que insistiu para o rei do cangaço conhecê-la. Na realidade, o fato é que Virgulino caiu de amores ao vê-la. E, impressionado com a sua beleza, passou a chamá-la de Maria Bonita.
            
Em vez de três dias, ficou dez na Fazenda Malhada da Caiçara. Com a concordância dos pais, que apoiavam o desejo da filha, Maria Deia coloca as suas roupas em dois bornais, penteia os cabelos, despede-se para sempre do marido, e parte com Lampião rumo à caatinga. Era o ano 1931 e ela tinha 20 anos. Pouco tempo depois, Maria Bonita engravida e sofre um aborto. Mas, em 1932, o casal de cangaceiros tem uma filha. Chamam-na de Expedita. Maria Bonita dá à luz no meio da caatinga, à sombra de um umbuzeiro, em Porto de Folha, no estado de 
Sergipe. Lampião foi o seu próprio parteiro.

Como se tratava de um período de intensas perseguições e confrontos, e a vida era bastante incerta, os pais não tinham condições de criá-la dentro do cangaço. Os fatos que ocorreram viraram um assunto polêmico porque uns diziam que Expedita tinha sido entregue ao tio João, irmão de Lampião que nunca fez parte do cangaço; e outros testemunharam que a criança foi deixada na casa do vaqueiro Manuel Severo, na Fazenda Jaçoba.

O Capitão Virgulino adora ser fotografado e filmado. Neste sentido, consente que Benjamim Abraão, um fotógrafo libanês, conviva durante meses com o seu bando e colete muito material sobre o cangaço. Esse fotógrafo, contudo, é assassinado por um coronel, e grande parte do seu acervo é destruída. Maria Bonita sempre insistia muito para que Lampião cuidasse do olho vazado. Diante dessa insistência, ele se dirige a um hospital na cidade de Laranjeiras, em Sergipe, dizendo ser um fazendeiro pernambucano. Virgulino tem o olho extraído pelo Dr. Bragança - um conhecido oftalmologista de todo o sertão - e passa um mês internado para se recuperar. Após pagar todas as despesas da internação, ele sai do hospital, escondido, durante a madrugada, não sem antes deixar escrito, à carvão, na parede do quarto: Doutor, o senhor não operou fazendeiro nenhum. O olho que o senhor arrancou foi o do Capitão Virgulino Ferreira da Silva, Lampião.

Além das emboscadas planejadas para liquidá-lo, cabe ressaltar que Lampião conseguiu sobreviver ao veneno e ao fogo. Do primeiro, contou com a dosagem fraca que lhe deu, somente, um inconveniente desarranjo intestinal; do segundo, apesar de chamuscado, conseguiu escapar pulando. Mas foi ferido à bala diversas vezes. Excetuando-se João, todos os irmãos de Virgulino morreram antes dele. Em 1926, Antônio foi morto em Serra Talhada, no encontro com uma volante pernambucana. Outra volante desse mesmo estado matou Levino Ferreira. O último a falecer foi Ezequiel, gravemente ferido pela polícia de Sergipe.

Mas, quando Lampião percebeu que seu irmão estava se ultimando e sofrendo, saca do próprio revólver e dispara um tiro de misericórdia bem em cima de sua testa. Em outra luta contra a volante pernambucana, na vila de Serrinha, próximo a Garanhuns, Maria Bonita foi baleada. Como estava perdendo muito sangue, Lampião deu ordem para encerrar a luta imediatamente: pega a amada nos braços e segue rumo ao município de Buíque, onde ela é tratada na vila de Guaribas. Vale deixar registrado que o bando de Lampião resistiu durante quase 20 anos, brigando com grupos de civis que o perseguiam e com a polícia de 7 estados nordestinos. Por todo esse tempo, assaltou propriedades de grandes fazendeiros, atacou  povoados, vilas e cidades, roubou, pilhou, torturou e matou os seus adversários.

Segundo a  revista eletrônica de ciências sociais - É impossível compreender a “Medicina” dos sertões sem conhecer da vida do sertanejo. Seu mundo estranho, suas crenças e, sobretudo o abandono ao qual essa parte do Brasil desde o império, até os dias atuais esteve submetida. Em “Os Sertões” Euclides da Cunha (S/d: 80) diz que “o sertanejo é, antes de tudo, um forte”. Só um “gigante” seria capaz de sobreviver em um meio tão hostil: A luta pela vida assume o caráter selvagem dos combates constantes com a terra árida e infértil. Sem expectativas de chuva, resta ao pobre apegarem-se as novenas de S. José já que as autoridades só aparecem nas eleições, época de angariar voto.

Diante daquela trágica realidade dá-se a transformação do homem: Brutal e cruel como a seca, forte como mandacaru. Em quanto o mundo moderno progredia, restavam os nossos sertões estacionados. Condenados a um primitivismo social e individual, vivendo em casebres sem reboco onde barbeiros encontravam viveiro ideal para disseminação da doença de Chagas. Sem saneamento básico, submetidos às enfermidades que lhe tornavam a vida insuportável. Quando não morriam de gastroenterite na infância, cresciam magricelas, deficiente em vitaminas e alma sobrecarregada de decepções.

Acostumado à subalimentação crônica, à fome e à sede aguda, o jagunço adquire condições para não queixar-se quando lhe é dado enfrentá-las (Lima 1965). “Fez-se homem, quase sem ter sido criança. Salteou-o, logo, intercalando-lhe agruras nas horas festivas da infância, o espantalho das secas no sertão” (Cunha: S/d, 82). Um médico naquelas bandas, geralmente filhos das autoridades regionais, era quase um Deus. Diante da adversidade transfigura-se o homem, e da figura vulgar do tabaréu, surge inesperadamente um “titã acobreado”, num desdobramento surpreendente de força e agilidade extraordinárias (Ibid: 80).

Sejam na forma de jagunços, capazes de resistir em Canudos a inúmeras investidas do governo; seja na forma de Cangaceiros: Pereira, Brilhante, Silvino, Lampião, Corisco; que marcharam diretamente para a violência e atacaram sempre que julgaram necessário. "O itinerário de Lampião ‘bandido brasileiro’ é o de um revoltado social que se torna herói popular. Um revoltado incapaz, por falta de cultura, de teorizar sua própria prática de delinquente e de propor uma leitura política para ela. Mas um rebelde que se insurge concretamente, de armas na mão, contra a hierarquia do poder no sertão, contra a justiça de classe, contra a ordem dos ‘coronéis’, contra uma sociedade colonial, e que, na sua escala, opta por uma contra sociedade, a do cangaço” (Le Monde: 1999).

É assim constituída a alma do tabaréu: sujeito a agressividade permanente do clima e da terra e ao abandono sócio – econômico. Está a sua disposição uma “Medicina rústica”, permeável á crendices: onde médicos e remédios, são necessariamente substituídos por curandeiros, beatos, preparados “mágicos” ou rezas que em enumeras vezes bastavam ao sertanejo. Segundo historiador Frederico Pernambucano de Melo o isolamento fez com que o cangaceiro vivesse de forma medieval, no que diz respeito aos seus costumes, insensibilidade perante a morte e trato com o sangue.

O menino sertanejo habituado a auxiliar seu pai a sangrar os animais com facas rudimentares para obtenção do seu sustento, quando adulto utiliza o mesmo método para dizimar o inimigo: “(...) Lampião, por exemplo, sangrava uma pessoa como o jovem fazia para matar um bode. Quando o bando castrou um de seus inimigos, a assepsia foi a mesma aplicada aos animais: cinza, sal e pimenta” ( O Estado de São Paulo: 1998).

Essa insensibilidade e instinto em situações de emergência, aliados a certo tirocínio cirúrgico, demonstrado por alguns integrantes dos bandos de cangaceiros e ainda ao conhecimento básico da farmacopeia do sertão; foram fundamentais para manutenção da vida e reabilitação dos feridos de combates nos ermos da caatinga nordestina. Em Aglaê Lima (1970:131), Lampião representava o cirurgião, clínico, ginecologista, parteiro e até dentista do bando. Essa mesma ideia, fruto da imaginação recreativa de muitos autores e da fantasia popular permeada pela mítica do cangaceiro, foi difundida por inúmeros autores estudiosos do movimento: “Praticavam extrações dentárias com pontas de punhais e alicates.

Em seguida bochechos de mandacaru. Raspa de juá evitava o aumento da cárie. Lampião, Zé Baiano, Lavareda e Virgínio eram os cirurgiões do cangaço” (Ibid: 138). Dos remanescentes do Cangaço, uma figura peculiar e extremamente curiosa foi sem dúvida Dadá, companheira de Corisco; valente e destemida, deu contribuições significativas para o resgate histórico sobre a vida de Lampião e seu bando. Em depoimentos fornecidos ao escritor Antônio Amaury, um dos maiores pesquisadores do assunto, a cangaceiro declara que desconhece Lampião removendo balas, amputando membros, realizando partos complicados e muito menos arrancando dentes. “Arrancar um dente ainda não ‘amolecido’ pela piorreia é trabalho hercúleo (...)”. Portanto, afirmar que lampião ou qualquer outro cangaceiro era ‘dentista’ é pura balela.

O sertanejo, de um modo geral, tem dentição forte, bem calcificada, haja vista sua grande ingestão de cálcio, através de leite e derivados.

Pelo menos até aparecerem as afecções odontológicas endêmicas no sertão nordestino. Pois “um dente já sem sustentação, comido pela placa bacteriana e pela piorreia, esse até uma criança o arranca” (Araújo e Fernandes: 2005, 80). Com base em relatos históricos podemos dizer que em inúmeros momentos, com um pouco de bom censo e muita coragem, vários procedimentos médicos improvisados, foram realizados de forma empírica e inclusive com algum êxito pelos cangaceiros; no entanto jamais poderemos nomeá-los “paramédicos”, mas seres munidos de um relevante instinto de sobrevivência e que atribuíam sua saúde ao fechamento do corpo, aos patuás e tinham ao seu dispor a farmacopeia aprendida com seus pais e avós.

Nesse particular, merece destaque a já citada Dadá que em muitos momentos mostrou habilidade cirúrgica admirável, apesar de nunca ter frequentado se quer uma escola de ensino médio. Em fevereiro de 1939, nas proximidades da fazenda Lagoa da serra-se, Corisco foi atingido por um projétil de arma de fogo que atravessou o braço direito e logo após o esquerdo, resultando em fraturas expostas e grande hemorragia. Passado algum tempo, começou a apresentar braços arroxeados pelos hematomas, edema e perda de consciência. Dadá aplicou-lhe uma mistura de pó de fumo nas feridas para aliviar a dor (Ibid: 25-36). A analgesia deu-se provavelmente devido ao encobrimento das terminações nervosas que estavam expostas.

Dadá afirma que posteriormente formou-se um abscesso na área lesada, fez uso de um emplasto com farinha de mandioca e quando o pus superficialismo procedeu a drenagem (Araújo:1969-1970). A farinha de mandioca quente funcionava como um vaso dilatador local, possibilitando uma maior irrigação sanguínea e chegada de células de defesa que ao liberar moduladores químicos contribuiriam para a resolução do quadro. “Depois Dadá flambou, na chama de uma vela, a lâmina de um canivete e fez uma incisão na altura do cotovelo esquerdo de corisco. A abundante secreção sanguinolenta vazou o braço do cangaceiro ‘desinchou’ e o alívio da dor foi quase completo” (Araújo e Fernandes: 2005 33). Embora a atitude corajosa de Dadá ao drenar os abscessos e desbridar os ferimentos de Corisco, livrou-lhe de uma septicemia, deixou a desejar do ponto de vista funcional.

A partir do episódio, o vingador de lampião só podia atirar com arma pequena, estava impossibilitado de segurar o fuzil (Ibid: 35). Lesões em abdome por arma de fogo ou arma branca eram fechadas com agulha de costurar couro (Oliveira: 1970 134). A retirada dos projéteis era feita sem anestesia: “(...) Zé Sereno notou um ‘caroço’ no pescoço de novo tempo e perguntou: Que caroço é esse no seu pescoço, cumpadi? Será a bala do Ontoím do pau preto? (...) Nisso, botou a faca no fogo, derramou cachaça no gume, espremeu o ‘caroço’ entre o indicador e o polegar e deu pequeno talho: A bala pulou longe!” (Araújo e Fernandes: 2005 68). Em Aglaê Lima (1970: 137) “Extraiam-se as balas a cru na ponta do punhal, a luz dos candeeiros.

Para a sede excessiva quando se sentia perder a visão, os lábios grossos, a boca espumante, conseguida a água, deveria ser servido aos goles, misturada com rapadura”. Uma entidade bem conhecida dos médicos em geral é o choque hipovolêmico. Síndrome decorrente da má perfusão tecidual, caracterizada pela diminuição da volemia, secundária a hemorragia, diarreia e trauma; o tratamento inicial consiste em debelar a fator causal e repor volume (Borges e Cols.: 2005 41-44). O tabaréu do sertão, empiricamente utilizava a água com rapadura para evitar o mal; ou ainda água de genuíno e arnica: “Andaram mais um pouco e Corisco teve uma lipotimia (sensação de desmaio) decorrente da hemorragia dos seus ferimentos. Pararam, Dadá deu-lhe uma dose de cachaça de quixabeira, misturada com arnica e água de genuíno. Logo a ferida voltou a si, criou forças e retomaram a caminhada” (Araújo e Fernandes: 1995, 30).

Nesse caso, é pouco provável que o choque hipovolêmico tivesse se instalado, já que é fato, a impossibilidade de reverte o quadro já estabelecido sem no mínimo, uma reposição volêmica rápida com a substância predominantemente perdida, além de oxigeno terapia (Borges e cols.: 2005, 41-44).Em meados de 1927, Lampião fugiu para o Raso da Catarina na Bahia. Em suas andanças, chegou a uma das regiões mais secas e inóspitas do Brasil, o povoado de Santa Brígida, onde vivia Maria de Déa, que mais tarde seria conhecida como Maria Bonita: Primeira mulher a fazer parte do cangaço (Os Caminhos da terra: 1998).

A novidade abriu espaço para que outras mulheres acompanhassem os cangaceiros; trazendo consigo um grande problema para o bando, a gestação e o parto. “A gravidez no cangaço era uma grande preocupação para os grupos. Além de serem redobrados os cuidados com a segurança do bando, eles procuravam lugares ermos, fora da rota de volantes, mas próximos a costeiros de confiança e, eventualmente, de uma boa parteira” (Araújo e Fernandes:  1995, 87). As crianças não eram amamentadas pelas mães naturais, mas deixadas com amigos de confiança em coitos seguros.

Assim ocorreu com Expedita Ferreira, filha única de Lampião e Maria, que logo após o nascimento foi entregue pelo pai a um casal que já tinha onze filhos; durante os cinco anos e nove meses que viveu até o falecimento dos seus pais, só foram visitados três vezes (Os Caminhos da terra: 1998). A vida no cangaço já era perigosa e sacrificante para homens feitos; imagine para uma criança indefesa. Em Antônio Amaury e Leandro Cardoso (1995: 87-89), o auxílio de parteiras constituiu exceção no cangaço, a falta de assistência ao parto, em algumas situações implicou em óbito dos recém-nascidos. Assim das gestações de Maria Bonita, somente uma criança conseguiu sobreviver; justamente a que veio ao mundo pelas mãos de uma parteira.

O parto transvaginal, normalmente evolui de forma espontânea; para isso, é preciso que o canal, as contrações uterinas, musculatura abdominal e pélvica, além do feto e seus anexos interajam de forma harmônica. O surgimento de anormalidades nesses fatores pode levar a distorcias, determinando impossibilidade de progressão do parto por via natural, culminando com morte da mãe e, ou do concepto na ausência de assistência adequada (Borges e cols.: 2005 1190-1191).

Como exemplo, temos o de Adelaide de Criança que morreu em 1936 nas caatingas sergipanas, após uma provável distorcia ( Costa: 2002, 147-149). Segundo Aglaê Lima (1970: 137), os partos eram realizados em condições precárias e sem os mínimos cuidados com mãe e filho: “As bandidas tinham partos normais, sem nenhuma higiene”.

O umbigo do menino era cortado com unhas e não contraíam tétano”. Inúmeras afecções poderiam colocar em risco de vida a cangaceira grávida nos ermos da caatinga, sem médicos e assistência pré-natal: o abortamento e suas complicações, diabetes gestacional, trauma abdominal, hipertensão materna; além de descolamento prematuro da placenta, choque hemorrágico e apresentações anômalas 3. Embora não tenha registros precisos, tudo leva a crer que a mortalidade materno-fetal nos bandos não era desprezível, já que não havia o mínimo de planejamento familiar, assistência pré-natal e assistência ao parto. Tripé esse responsável pela redução da morbidade e mortalidade perinatal nos dias atuais (Borges e cols.: 2005 1109). Os anais do cangaço registram ainda fatos curiosos; empiricamente os tabaréus eram capazes de perceber a gravidade de alguns quadros, realizavam diagnósticos e até prognósticos.

Dessa forma, quando um projétil de arma de fogo penetrava o abdome e o sangue saia de cor escura, significa gravidade, o que muitas vezes se confirmava pela morte do enfermo (Oliveira: 1970 134).

 A explicação desse fato deve-se a uma provável lesão de uma veia calibrosa, como a veia cava ou veia hepática, ou ainda uma lesão de órgão maciço, como o fígado o que levaria a uma grande perda sanguínea e até morte por choque hipovolêmico (Araújo e Fernandes: 1995 90). Outra prática curiosa utilizada para o prognóstico de lesões no abdome era cheirar a ferida; no caso de cheiro de fezes o prognostico era sombrio. “Se os intestinos foram perfurados, tratava-se de preparar a rede para enterrar: fedeu a cocô, fede a defunto” (Oliveira: 1970 134).

As lesões do intestino grosso, em virtude da flora e das características anatômicas e fisiológicas do órgão são acompanhadas de índices consideráveis de mortalidade. Para se ter uma ideia, na Guerra Civil Americana a mortalidade devido as lesões de cólon estava próximo de 100% e durante a I Guerra Mundial ficou em torno de 60% (Erazo: 1998). Nesses casos, o material fecal leva a uma irritação do peritônio, ocasionando uma peritonite fecal, com evolução para septicemia e morte (Araújo e Fernandes: 1995 90-91).

1.1    A morte de lampião

A morte  de Virgulino Ferreira da Silva ocorreu  no dia 28 de julho de 1938, Conforme o costume de anos a fio, o bando acampou na fazenda Angicos, situada no sertão de Sergipe, esconderijo tido por Lampião como o de maior segurança. Era noite, chovia muito e todos dormiam em suas barracas. Na madrugada do dia 28, a volante chegou tão de mansinho que nem os cães pressentiram. Quando um do cangaceiro deu o alarme, já era tarde demais. 

Não se sabe ao certo quem os traiu. Entretanto, naquele lugar mais seguro, segundo a opinião de Virgulino, o bando foi pego totalmente desprevenido. Quando os policiais do Tenente João Bezerra e do Sargento Aniceto Rodrigues da Silva, abriram fogo com metralhadoras portáteis, os cangaceiros não puderam empreender qualquer tentativa viável de defesa.  O ataque durou uns vinte minutos e poucos conseguiram escapar ao cerco e à morte.

Dos 34 cangaceiros presentes, 11 morreram ali mesmo. Lampião foi um dos primeiros a morrer. Logo em seguida, Maria Bonita foi gravemente ferida. Alguns cangaceiros, transtornados pela morte inesperada do seu líder, conseguiram escapar. Bastante eufóricos com a vitória, os policiais saquearam e mutilaram os mortos. Roubaram todo o dinheiro, o ouro, e as joias. A força volante, de maneira bastante desumana, decepa a cabeça de Lampião. Maria Bonita ainda estava viva, apesar de bastante ferida, quando sua cabeça foi degolada.

O mesmo ocorreu com Quinta-Feira e Mergulhão: tiveram suas cabeças arrancadas em vida. Feito isso, salgaram os seus troféus de vitória e colocaram em latas de querosene, contendo aguardente e cal. Os corpos mutilados e ensanguentados foram deixados a céu aberto para servirem de alimento aos urubus. Guardadas as devidas proporções, após ter passado, praticamente, cento e cinquenta anos da Revolução Francesa, os brasileiros retrocederam ao século XVIII, decepando cabeças como fizeram com Luís XVI e Maria Antonieta.

Percorrendo os Estados nordestinos, o coronel João Bezerra exibia as cabeças - já em adiantado estado de decomposição - por onde passava, atraindo uma multidão de pessoas. Primeiro, os troféus estiveram em Maceió e, depois, foram ao sul do Brasil. No Instituto de Medicina Legal de Maceió, as cabeças foram medidas, pesadas, examinadas, pois os criminalistas achavam que um homem bom não viraria um cangaceiro: este deveria ter características sui generis.

Ao contrário do que pensavam alguns, as cabeças não apresentaram qualquer sinal de degenerescência física, anomalias ou displasias, tendo sido classificados, pura e simplesmente, como normais. Do sul do País, apesar de se encontrarem em péssimo estado de conservação, as cabeças seguiram para Salvador, onde permaneceram por seis anos na Faculdade de Odontologia da Universidade Federal da Bahia. Lá, tornaram a ser medidas, pesadas e estudadas, na tentativa de se descobrir alguma patologia.

Posteriormente, os restos mortais ficaram expostos no Museu Nina Rodrigues, em Salvador, por mais de três décadas.  Durante muito tempo, as famílias de Lampião, Corisco e Maria Bonita lutaram para dar um enterro digno aos seus parentes. O economista Silvio Bulhões, em especial, filho de Corisco e Dadá, empreendeu muitos esforços para dar um sepultamento aos restos mortais dos cangaceiros e parar, de vez por todas,  essa macabra exibição pública. Segundo o depoimento do economista, dez dias após o enterro do seu pai violaram a sepultura, exumaram o corpo e, em seguida, cotaram-lhe a cabeça e o braço esquerdo, colocando-os em exposição no Museu Nina Rodrigues.

O enterro dos restos mortais dos cangaceiros só ocorreu depois do projeto de lei no. 2867, de 24 de maio de 1965. Tal projeto teve origem nos meios universitários de Brasília (em particular, nas conferências do poeta Euclides Formiga), e as pressões do povo brasileiro e do clero o reforçaram. As cabeças de Lampião e Maria Bonita foram sepultadas no dia 6 de fevereiro de 1969. Os demais integrantes do bando tiveram seu enterro uma semana depois. Virgulino morreu aos 41 anos de idade.

No entanto, contabilizando-se os riscos enfrentados durante 20 anos de cangaço, a alimentação incerta, as emboscadas, os ferimentos, a falta de assistência médica, entre outros, pode-se afirmar que o rei do cangaço viveu mesmo muito tempo.

Vale registrar, por outro lado, que Lampião e Maria Bonita possuem parentes próximos em Aracaju: sua filha, Expedita, casou com Manuel Messias Neto e teve quatro filhos (Djair, Gleuse, Isa e Cristina). Por fim, a grande inteligência de Virgulino Ferreira da Silva, bem como o seu valor como estrategista valem a pena ser ressaltados. Mais de sessenta anos após sua morte, ele continua sendo lembrado na música, na moda, na literatura de cordel, no teatro, no cinema, em escolas, em museus, em conferências e debates.

O temido cangaceiro, indubitavelmente, o mais importante e carismático de todos, deixou gravado nas caatingas sertanejas um pedaço da história do Nordeste do Brasil.’’ . (Fonte: VAINSENCHER, Semira Adler. Lampião (Virgulino Ferreira da Silva). Pesquisa Escolar.), Online, Fundação Joaquim Nabuco, Recife. Disponível em: http://basilio.fundaj.gov.br/pesquisaescolar. Acesso em: 23/03/2014 As 15h30minhs.  Recife, 24 de julho de 2003. (Texto atualizado em 19 de março de 2008). O fim do cangaço realmente  aconteceu em um momento onde o Brasil estava envolvido pelo ideal nacionalista e autoritário de governar do Estado Novo, período republicano brasileiro de 1937 a 1945.

O governo classificou os cangaceiros como subversivos e reforçou as políticas de repressão a níveis federais. Em finais da década de 30, já era repelida de maneira significativa as ações dos bandidos. O próprio cangaceiro Lampião, maior sustentáculo do cangaço independente do período foi exterminado em 1938, tendo logo depois sua cabeça exposta em espaço público como sinal de coibição aos bandoleiros. Pouco depois, em 1940, morre um dos últimos grandes líderes, Corisco, conhecido também como “diabo louro”. Sua morte é reconhecida simbolicamente como o fim do cangaço. ( ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz de. A Invenção do Nordeste e outras artes. 5 ed. São Paulo: Cortez, 2011. Pp. 143 – 144.).

1.2      A medicina popular do  Cangaço

A medicina do cangaço não difere em nada, da utilizada pelo sertanejo em geral. Nas comunidades mais atrasadas, mesmo após o advento da indústria farmacêutica, que no Brasil só aconteceu no início do século XX, o alívio das dores era procurado nas qualidades terapêuticas de algumas plantas ditas medicinais. Até hoje o socorro médico está ligada a praticas rústicas aprendidas com negros, portugueses e índios.

Para Mario Souto Maior a medicina popular constitui consequência de uma preocupação humanista de aliviar o sofrimento humano. Atividade do curandeiro e de seus usuários decorre de uma vocação médica, de uma constante observação da fármaco-dinâmica de plantas, aliados a um conhecimento precioso a respeito de vegetais de efeitos medicinais maravilhosos, mas que mal utilizados podem trazer resultados danosos ao usuário.

Tal conhecimento é fruto de séculos de experimentações e ainda que permeados por erros e riscos se mostrassem muito útil ao tabaréu, visto que no sertão era rara a presença de um médico. Para se ter uma ideia, os cangaceiros só conheceram as propriedades do ácido acetila - salicílico em 1929, através do Capitão-Médico do exército Eronildes de Carvalho que ofereceu um comprimido do analgésico para um bandoleiro com dor de dente (Araújo e Fernandes: 2005, 131). Não é incomum observamos uma estranha junção entre chás, lambedores, efusões, emplastos, defumadores; mas também benzeduras, simpatias e orações que os cangaceiros utilizavam para cura das suas doenças.

 A farinha, além de alimento indispensável, era utilizada como emplastro, no tratamento dos  abscessos. Os matutos acreditavam que o emplastro quente com farinha, sobre regiões inflamadas evitava que a lesão “viesse a furo”. Para Araújo e Fernandes a melhora do quadro se devia à vasodilatação decorrente do calor local e consequente chegada de um maior número de leucócitos, o que em última instância abreviava o processo inflamatório. Já o fumo em pó era utilizado sobre feridas abertas, com objetivo de evitar infecções secundárias, ovo posição de moscas varejeiras e miasse. (Araújo e Fernandes: 2005 92-93).

“Segundo o ex - cangaceiro e escritor Joaquim Góis, Lampião e seus “cabras” traziam como parte integrante do seu “ carrego” uma botica improvisada com tintura de iodo, pó de Joanes, água forte, pomada de São Lázaro, linha e agulha, algodão, um estojo de perfumes com brilhantina, óleo extratos e essências baratas. (Góis: 1966, 37-40).Em depoimentos fornecidos por Dadá, a cangaceira relatou que ao abraçar a profissão ,os homens levavam “mezinhas”, plantas, misturas e alguns produtos como cachaça ,álcool e água oxigenada.

 Para Araújo e Fernandes embora esses produtos não tenham eficácia comprovada, é notável a ação antimicrobiana do álcool e peróxido de hidrogênio, Principalmente contra o Clostridium tétano, causador do tétano. (Araújo e Fernandes: 2005,92).  O Juá e a arnica são elementos fundamentais para o sertanejo no tratamento de grandes traumatismos decorrentes de quedas, acidentes, esmagamentos, facadas ou tiros.

 As empregadas colocavam cascas de jenipapo nas luxações, fraturas e contusões era uma prática comum. Em traumatismo ocasionado por coice de burro usavam um emplasto de mastruço, carvão moído e esterco de animal. O chá de quixabeira também era recomendado para cicatrização(Seraine:1983, 142-145). A raspa do pau de quixabeira era misturada com álcool ou cachaça e ingerida ou colocada sobre o ferimento; segundo os cangaceiros a ingestão dessa mistura reanimava e dava uma sensação de força ao doente. (Araújo e Fernandes: 2005,93).No ferimento à bala, aguardente, água oxigenada e pimenta malagueta seca eram introduzidos através do orifício de entrada. Segundo alguns sobreviventes, o tratamento era muito doloroso e mais angustiante do que a própria lesão. (Ibid: 92).

Na vida errante do cangaço a quantidade e qualidade da alimentação dependiam da situação: Quando perseguidos, se alimentavam às pressas, as colheres eram substituídas pelas mãos sujas em forma de concha, sem nenhuma higiene. Panelas de barro, latas e batatas de umbu eram utilizadas para cozinhar os alimentos; na maioria das vezes constituídos de carne seca de bode ou boi, rapadura e farinha. “Quando nos “coitos” livres dos “macacos”, os cangaceiros se alimentavam fartamente, após as refeições descansavam, contavam os “ causos” e gargalhavam. (Oliveira: 1970, 139-145). Mezinhas, amuletos e rezas eram utilizados para “fechar o corpo” contra os inimigos ou para espantar cobras e animais peçonhentos, além de recomendações no mínimo estranhas: dessa forma, mulher menstruada era impedida de entrar nos quartos dos feridos de guerra,” para não arruinar a ferida”.

O tratamento de doenças venéreas era feito com sumo de 12 limões bebido em jejum logo após o sol nascer. Não podia olhar para mato verde e nem para mulher; banho de rio nesses casos era proibido porque “ficava cego”, quando atingia os testículos ou em casos de “mula” (linfogranulomatose) o doente acocorava-se sobre o fogo. Se a afecção fosse o tétano, o tabaréu se vestia de preto, ficava em um cômodo escuro e incomunicável. Em lesões graves, dentre outros cuidados o doente devia evitar “pisar em rastro de corno”. (Ibidem: 131-139). No livro “Lampião, Cangaço e Nordeste”, a escritora Aglaê de Oliveira cita outros exemplos da farmacopeia cangaceira utilizada para o tratamento de enfermidades comuns nos bandos: Cefaleia: Folhas de algodão aquecidas e mascar o gengibre. Faringite: Chá de formiga e gargarejo com sal .

Doenças reumáticas: Banha de capivara, chá de osso de jumento, carne de cascavel. Otites com leu correia: Banha de traíra. Asma: Banha de ema. Constipação: Alecrim caseiro. Sinusite: Alecrim salobro. Diabetes: Jucá. Epistaxe: Cheirar algodão queimado. Otalgia: Tampões de folhas de algodão.

Entorses e luxação: Emplastro de clara de ovo batida com breu e untar o local atingido, com banha de ema. Mordedura de cobra: Queimava o local da picada imediatamente ou realizavam um corte com faca afiada para escorrer o veneno. Halitose: Mastigar folhas da goiabeira branca. Hemorragia: Suco de arnica. Cardiopatias e lipotimia: Chá de quiabo. Epilepsia: Chá de perna de garça. Ascaridíase: Erva de cruz. Difteria: Banhos de sândalo e alcaçuz. Hidrocele e hérnia: Banha de baiacu. Enterites: Chá de erva cidreira, Sapiranga. Escabiose: Raspa de coco misturada mistura com enxofre, passando 8 dias sem molhar.: Chá de velame, chá de cabeça de negro em jejum e água de arroz. À pimenta e ao caminho em jejum chamavam “mingau levanta homem”.

Para suspender a menstruação: Semente de mangiroba em infusão. Infusão de grão e café na aguardente, durante 9 dias. Febre alta: Suador de semente de melancia e a casca de angico em água serenada. “Fraqueza dos pulmões”: Leite de jumento pela manhã. Prisão de ventre: Chá de raiz da jitirana, retirada do nascente.

As marcas que lampião deixou  na vida e na memória das pessoas tornando-se assim mito e herói onde a população o denominaram de  rei do sertão.

As histórias do cangaço ainda permanecem vivas nas cidades do Nordeste. Relatos tristes e alegres são contados pela lira dos repentistas, imortalizados por livros, filmes e melodias como “mulher rendeira”, enquanto as crianças romantizam a vida errante, o heroísmo das batalhas e as “brabezas” de Lampião por esses sertões. Mas a vida de quem escolhia o banditismo não era fácil, as fugas dos volantes, as refeições improvisadas, as enumeras noites insones em condições insalubres, as batalhas sangrentas, tornavam cada dia uma aventura árdua na luta pela sobrevivência. Lampião viveu 23 anos em guerra e passou por mais de 400 tiroteios, não é de admirar que tenha sofrido muitos ferimentos ao longo de sua vida de “fora da lei” (Araújo e Fernandes: 2005,167).

Em entrevista fornecida ao médico, Dr. Octacílio Macedo, durante sua visita a Juazeiro do Norte quando foi convidado pelo padre Cícero Romão para integrar o Batalhão Patriótico contra a coluna prestes, Lampião informou já ter recebido quatro ferimentos importantes, dos quais, um na cabeça foi considerado por ele o mais grave, referiu ainda sofrer de “ligeiros ataques reumáticos” (Observatório da imprensa: 1998).

A primeira lesão grave de Lampião se deu quando ainda fazia parte do grupo do Sinhô Pereira, em 1922. Na ocasião foi atingido na região inguinal, no braço direito e recebeu um tiro de raspão na cabeça. Foi atendido e medicado pelo Dr. Mota, médico de Vila Bella-PE, recuperando-se sem nenhuma sequela( Fernandes e Araújo: 2005, 167-172). Em Março de 1924, nas proximidades da lagoa do  Vieira (divisa de Pernambuco e Paraíba), foi ferido no tornozelo direito, ao mesmo tempo em que o jegue no qual estava montado fora mortalmente atingido, prendendo-lhe ao cair, o membro machucado (Melo: 1993, 151). O tiro deixou-lhe uma sequela cicatricial devido a lesão importante no tendão de Aquiles, e, ou nos músculos flexores do pé direito.

A partir de então passou a utilizar calçados de rabichos, com reforço na parte do calcanhar. Dessa forma o seu rastro tornou-se inconfundível, sendo fácil para os rastejadores identificaram o Grupo de Lampião pela pisada (Araújo e Fernandes: 2005, 19-21).Em “Lampião o último Cangaceiro”, o escritor e ex-volante Joaquim Góis (Araújo:1969), refere que na Chacina em Angico, para certificar-se que um dos corpos de capitados pertencia ao cadáver de Lampião, valeu-se da cicatriz atrófica no pé direito de um dos mortos.

Esse fato deve ter dado origem à crença de que o grupo de Lampião usava as alpercatas de forma contrária com o objetivo de confundir a polícia. Na verdade o reforço na parte do calcanhar impedia que o calçado saísse do pé lesionado, durante a deambulação.  Dr. José Cordeiro de Lima, foi quem tratou do cangaceiro; a quem o médico se referia sempre como “capitão” devido à bravura e resistência demonstradas durante os procedimentos cruentos, nos quais Virgulino não esboçou se quer um gemido.

A figura do “monarca das caatingas”, com o olho direito esbranquiçado, usando seus óculos redondos, levanta uma polêmica há muito tempo discutida entre os estudiosos e amantes do cangaço: Seria lampião realmente cego do olho direito? Qual a patologia responsável pela lesão ocular? Em Maria Isaura Pereira de Queiroz é relatado a frequência que os jornais referíamos óculos de Lampião. Para alguns autores tratava-se de uma coqueteira utilizada para  esconder o olho cego e de “vidro”. Para outros, os óculos era uma necessidade, devido à fotofobia.

Em “O Povo”, de Fortaleza, é descrito na edição de 5 de agosto de 1928, os óculos de lentes escuras, usados para esconder uma doença que atingiu a córnea do olho direito. Em “Lampião”, o escritor Ranolfo Prata faz referência a o olho direito cego, por um garrancho de jurema, que lacrimejava constantemente. Leonardo Motta, célebre folclorista cearense, assim o descreve: “(...) o olho direito branco e cego, escondido pelos óculos pardacentos, de arcos dourados...” (in: Araújo: 1982, p.76).

A análise do laudo médico da cabeça de Lampião, feito em Maceió - Al, pelo médico-Legista da Polícia Militar, Dr. Lajes Filho, nos leva a concluir que Lampião era funcionalmente cego do olho direito: “(...) O olho direito apresenta um leucoma, atingindo toda a córnea...” (Rocha, 1998) Segundo o relato do oftalmologista alagoano Dr. Neves Pinto, na edição de 5 de agosto de 1938, a lesão era irreversível: “(...) leucoma adberente central, na maioria das vezes consequente de úlceras perfuradas de córnea, e em vista da extensão das lesões, poderia assegurar que o caso era incurável.”

Refere ainda um cristalino luxado no olho esquerdo, devido provavelmente aos violentos traumatismos sofridos pela cabeça de lampião.

Segundo Dona Mocinha, Virgulino já possuía baixa da acuidade visual, mesmo antes de entrar no Cangaço; assim como outros membros da família.  Sendo as afecções da córnea endêmicas no nordeste brasileiro não se pode afastar a possibilidade de uma etiologia infecciosa como sarampo, tracoma como causa do leucoma, fotofobia e lacrimejamento. (Araújo e Fernandes: 2005).

Para a neta do cangaceiro, a historiadora Vera Ferreira, em entrevista exclusiva a Agência Nordeste; a lesão se deu em um combate, quando um tiro atingiu uma planta e o espinho respingou no olho, já acometido pelo glaucoma (Diário do Nordeste: 1998). O glaucoma é uma patologia, na qual a pressão intraocular está em níveis tão elevados que pode resultar em dano do nervo óptico e perda do campo visual, sendo o seu diagnóstico um grande problema de saúde pública (Langston: 2001 301). È lamentável que mesmo nos dias de hoje, as populações nordestina percam a acuidade visual por causas que poderiam ser evitadas desde que medidas de diagnóstico e tratamento fossem implantadas pelas autoridades responsáveis.

Depois de sua morte segundo relata o autor aqui vai explicar o que fizeram com os restos mortais  ou seja com a cabeça nessa instituição de  medicina legal.  Na ocasião, Lampião foi tratado pelo médico José Cordeiro de Lima (destaque pela atuação na luta contra o tracoma no Cariri cearense), que retirou o corpo estranho do seu olho e como não se dispunha de antibióticos na época, provavelmente só foi realizada profilaxia de lesões secundárias e antissepsia, concorrendo para uma cicatrização descomplicada. (Araújo e Fernandes: 2005,43).

Diante dos depoimentos apresentados é bem possível que lampião não tenha nascido cego, mas teve problemas com seu olho direito: Traumático, infeccioso ou até carência (falta de vitamina A) na infância ou adolescência que mais tarde; precisamente em 21 de agosto de 1925, próximo à baixa do Juá, Pernambuco (Ibidem: 39-44), foram agravados pelo espinho certeiro que lhe atingiu o olho já doente. “(...) O olho cego do Capitão Virgulino Ferreira não o impediu de torna-se uma figura polêmica, escrevendo com sangue e coragem a sua saga na memória histórica do Nordeste brasileiro, e de maneira muito singular no contexto sociológico do banditismo mundial.” (Ibidem: 44-45).

Sofreu ainda duas lesões leves: um ferimento a abala em 1926, em região escapular e outro no quadril em 1930, no município de Itabaiana - SE. (O girassol, 11 de fevereiro de 2006). Nas margens sergipanas do São Francisco; Angico-SE, 28 de julho de 1938 Lampião recebeu um tiro na região do tórax, outro no baixo ventre, e um terceiro a queima-roupa na cabeça (Araújo e Fernandes: 2005,171). O projétil de arma de fogo que atingiu o crânio fraturou o mandibular o frontal, o temporal e parietal direitos, levando-lhe a morte (Rocha: 1942 48-49). Para Aglaê oliveira os cangaceiros foram abatidos como bois.

A matança dos onze bandidos mostrava como era primitiva a vingança das autoridades contra as atrocidades cometidas pelos cangaceiros. As cabeças decepadas e insepultas passariam por um dos “espetáculos” mais tenebrosos vivenciado pela população brasileira. Acrescenta a autora: “(...) É inacreditável que, à semelhança de modernos giros, o Brasil ostente mais essa singularidade. País exibidor de crânios humanos, aos quais os filhos dos exibidos assistem como expectadores.” (Oliveira: 1970 377).para entendermos melhor aqui esta alguns aspectos médico legal do cangaço. Pois a existência de uma personalidade criminosa sempre foi uma polêmica para  psiquiatras, antropólogos e sociólogos.

A discussão que sempre existiu sobre a conduta humana se dá entre dois argumentos causais: Existiria um determinismo criminoso, galgado na constituição biológica, social e vivencial que levaria a pessoa a agir dessa ou daquela forma, ou haveria o livre arbítrio, o qual implica na consequência e punibilidade dos atos? Em 28 de julho de 1938, quinta-feira, no Angico, Lampião e mais 10 bandidos foram mortos e degolados. Suas cabeças não só foram exibidas em público para assombramento da população sertaneja, como também as fizeram de bola de futebol. (Araújo e Fernandes: 2005 171-172).

Maria Bonita foi ferida com dois tiros; o primeiro nas costas e o segundo no abdome, por José Panta de Godoy (Araújo: 1982 99-110). Para o médico Arnaldo Silveira, em entrevista concedida ao jornalista Cláudio Bojunga, a cangaceira foi degolada com vida (Jornal de Alagoas: 4 de agosto de 1938). Segundo os escritores Antônio Amaury e Fernandes é possível que Maria além de viva estivesse consciente, já que testemunhas do massacre relataram uma conversa entre a vitima já baleada e o cangaceiro Luis Pedro  (Amaury e Fernandes: 2005,173-174). A iniciativa de degolar os cangaceiros partiu do aspirante Ferreira de Melo. As cabeças foram salgadas e postas em latas de querosene, com aguardente e cal. Nos degraus capela nomeada “O monumento” de Santana do Ipanema  foram exibidas pela primeira vez, como troféus, enfeitadas com belos adornos, cartucheiras e punhais. Em seguida seguiram para Maceió, sendo expostas na Praça Velha da Cadeia, onde verdadeira multidão disputava o melhor lugar para assistir a cena.

 Esse fato atesta que soldados e cangaceiros eram figuras praticamente indissociáveis, no que diz respeito às barbaridades praticadas no sertão nordestino. (Oliveira: 1970, 370). Após o acontecimento esdrúxulo foi enviada então a um cientista para ser analisada: era preciso descobrir o que havia ali, que teoria explicaria o comportamento muitas vezes bárbaro do rei das caatingas e de seus seguidores. Caberia a ciência dizer a última palavra. Em 1838 para designar certas formas de loucura Esquirol propôs o termo “Monomania Homicida”, uma desordem ética e moral que levava a prática de crimes. (Ballone revisto em 2002). A teoria da monomania homicida, apesar de não mais aceita influenciou no surgimento da Teoria da Degenerescência, desenvolvida por Morel em 1857 através da qual se desenvolveram as mais variadas teorias biológicas, psicológicas, sociológicas e antropológicas sobre o crime, criminalidade e criminoso que hoje conhecemos. Onde a degenerescência se definia como desvio de um tipo primitivo perfeito e transmitido hereditariamente.

Em 1870, V. Magnan (1835-1916) retomou Morel, Tentou reinterpretar a degenerescência à luz do evolucionismo, considerando-a um estado patológico, em que os desequilíbrios físico e mental do indivíduo degenerado interromperiam a evolução natural da espécie; (Ackerknecht, 1964; Bercherie, 1989; Serpa Jr., 1998). Os termos preconceituosos usados em relação aos sertanejos, fruto da miscigenação de índios, negros e brancos agora pretendiam ter fundamento científico. Partiam da degenerescência para explicar que à medida que se sucedessem as gerações nervosas gerariam neuróticos, que produziriam psicótico, que gerariam idiotas ou imbecis, até a extinção da linhagem defeituosa.

Nesse contexto surge o escritor italiano César Lombroso (1836-1909) criador de uma antropologia criminal, que relacionava crime e degeneração. Lombroso acreditava no criminoso nato, cujas características manifestar-se-iam no fenótipo do indivíduo. Essa teoria ganhou espaço entre legistas e psiquiatras, que tentavam identificar marcas somáticas para o crime, dentre elas citamos a fronte fugidia, proeminências ósseas, assimetria de face, caninos exagerados, mandíbulas possantes, proeminência occipital, orelhas em “abano”, o tubérculo darwiano de regressão ao macaco.

Medir e estudar crânio eram uma obsessão da época, vários cangaceiros tiveram suas cabeças decepadas e enviadas a médico-legistas da polícia militar alagoana em Maceió e à Faculdade de Medicina da Bahia para serem submetidas à cefalometria e à análise destas características (Lima: 1965 27-52). No Brasil, o médico maranhense Raimundo Nina Rodrigues (1862-1906), deu enormes contribuições à psiquiatria, medicina legal e antropologia estudavam as composições genéticas e comportamentais dos afrodescendentes e defendia que a loucura era um produto estrutural das raças e classes inferiores.

Instituindo um pensamento etnocêntrico como modelo de normalidade social. Contribui para a classificação das sociedades em normais e anormais (Revista Canudos: 2000,50). Nina Rodrigues, buscou cientificamente criar regras que avaliariam indivíduos cujo comportamento fosse doentio, além decidir quanto à sua imputabilidade penal e principalmente, sugerir meios preventivos para evitar a loucura e o crime. A ideia da degenerescência Lombrosiana como causa da doença mental, passou a ser vista pelos estudiosos modernos como retrógrada e ultrapassada; era preciso abandoná-la. Surgiam assim, os deterministas sociais: para os quais o meio, com seus fatores sociais e geográficos, seria suficiente para explicar a criminalidade.

Mais uma vez o livre arbítrio, a personalidade e os motivos do criminoso eram desprezados. Nesse sentido afirmava o professor Arthur Ramos: “No caso do cangaceiro ou do jagunço nordestino as coisas sociais predominam de muito sobre as coisas biológicas, orgânicas. O bandoleiro nordestino é um produto do seu meio social” (Jornal de alagoas: 1938). Para Euclides da Cunha o homem dos sertões está em função imediata da terra, sendo a perfeita tradução moral dos agentes físicos da natureza que o rodeia. Ela talhou-o a sua imagem: bárbaro, impetuoso e abrupto. É um retrógrado e não, um degenerado ( Cunha: S/d, 79-83). Por mais de um século houve apenas uma substituição de uma ideia determinista por outra. Inicialmente as constituições genéticas e hereditárias eram determinantes absolutas.

Posteriormente foi a vez do determinismo moral, onde o indivíduo podia já nascer degenerado. Em seguida, o determinismo psicológico pregava que as maneira da pessoa reagir era imutável e, finalmente, o determinismo social, onde as circunstâncias sociais empurravam invariavelmente a pessoa para o crime. (Ballone, 2002). O pensamento determinista só foi atenuado com a teoria fenomenológica de De Greeff,em meados do século XX.

De Greef leva em conta a necessidade de se conhecer profundamente a personalidade específica do criminoso; seus motivos, caráter, instinto, antecedentes sociais e não mais uma personalidade geral e própria dos Homens Criminosos. Debuyst trouxe o conceito de periculosidade; o qual incluía três elementos: a situação perigosa, a importância sociocultural do ato cometido e de volta, a personalidade  Criminosa.

Mais tarde, Digneffe propôs que o indivíduo é plenamente responsável pelos  seus atos. Hoje as principais teorias psicológicas da criminalidade poderão ser agrupadas em dois grupos: Um deles centrado nas diferenças que caracterizam a Personalidade Criminosa, específica do criminoso e determinador do ato delinquente (Pinatel, Le Blanc), e outro, o da análise do percurso do indivíduo na sociedade, sob o ponto de vista fenomenológico (Debuyst).

A criminologia moderna acredita que não exista diferença entre personalidade de delinquentes e não delinquentes; dessa forma, a “personalidade criminosa” seria uma interação de fatores genético, neuropsicológico, afetivo, cognitivo, político e vivencial. (Ballone revisto em 2002). O professor Estácio de Lima, em seu livro “O Estranho Mundo dos Cangaceiros” nos traz observações do biótipo, segundo a classificação de Kretschmer, além do perfil psíquico dos cangaceiros com quem conviveu e análises detalhadas das cabeças decepadas. Segundo  o pesquisador , o homem pícnico, gordo, alegre, falador, calvo, expansivo e bonachão é incompatível com a profissão de bandoleiro das caatingas.

Quanto aos leptossômicos, a este cabe a frieza, a introspecção, irritabilidade, a agilidade, guardando com mais facilidade as ofensas. Neste último, se tem delineado um possível cangaceiro (Lima: 1965 27-52).

No exame médico-legal da cabeça de Lampião, Dr. José Lages Filho conclui que embora presente alguns estigmas físicos na cabeça de Lampião, não há uma relação absoluta entre os caracteres somáticos encontrados e a figura moral do cangaceiro. Acrescenta o perito: “Faltam às deformidades cranianas, o prognatismo das maxilas e outros sinais aos quais Lombroso tanta importância emprestava para a caracterização do criminoso nato”(Rocha:1942, 48-49). Para Lages na busca da constituição delinquencial de Maria Bonita, seria importante um estudo psicológico da sua personalidade: “Não denunciam eles a existência de quaisquer estigmas de generescênça ou signas atávicos (....). Em verdade uma conclusão definitiva poderia ser tirada da apreciação physiopsichyca e biográphica da victima, único meio de revelar suas tendências criminosas mesmo se despertadas estas pela paixão e pelo amor”. (Jornal de Alagoas: 1938).

Ao contrário do que afirmava sombroso, os cangaceiros também não apresentavam duas das características esperadas em um criminoso nato: a covardia e a indiferença amorosa. A sua fisionomia é a do sertanejo comum, sem quaisquer diferenças ou anomalias (Lima: 1965, 27-52).

Para Oliveira (1970: 374), somos resultantes de uma complexa mistura entre negros, índios e brancos. Se Lucas Ferreira era um negro desalmado e Zé Baiano um cruel ferrador de suas vítimas, Corisco era louro, de olhos azuis, cabelos finos e um demônio, não menos perverso. Acrescenta a autora que os jovens sertanejos cheio de ilusões e ímpetos, testemunhas de bandos armados bem vestidos e alimentados, ingressavam nos bandos, independentemente de sangue de “valentão”, de ser negro, índio ou vesgo. Sua presença era um protesto contra a parcialidade existente na justiça.

A análise da gênese do cangaceiro é polêmica e complexa. Para alguns autores eles foram vítimas de um meio hostil, suas atitudes constituíam uma resposta a profunda crise pela qual a população sertaneja passava, como também um protesto contra a sociedade que os esquecia de e marginalizava. Para outros, entretanto, o cangaço era uma atividade extremamente lucrativa e Virgulino um perverso que alimentava sua megalomania de imperador do sertão, sendo temido tanto por coronéis como pelas classes mais miseráveis.

Não podemos, entretanto negar a força do mito do herói-bandido que ao mesmo tempo fascina e assusta os estudiosos do seu universo peculiar. A peculiaridade social e econômica do sertão nordestino possibilitou uma sociedade bastante criativa, onde se gerou uma cultura popular de muita riqueza temática e histórica. 129 Sua medicina singular é naturalmente fruto de uma religiosidade extrema; superstições, folclore e conhecimento empírico que conjugados formam uma fascinante mistura. Os exemplos citados demonstram que os sertanejos na ausência de socorro médico, usavam os elementos que estavam ao seu dispor. Na enfermaria improvisada das caatingas, colhiam seus remédios, tratavam seus doentes e quando a morte não podia ser evitada, restava-lhes enterrar os seus companheiros, embalados por rezas, cantigas e cachaça.

É fato o assombramento e despojamento que a caatinga nordestina nos provoca que nela habitam. Qualquer julgamento dos cangaceiros necessita de uma interpretação do seu universo singular e extraordinário; dos seus costumes, código de honra, sem desprezar as influências do meio hostil que endurece o homem. Embora a vida errante do cangaço muitas vezes era a única opção de subsistência para o sertanejo, cairíamos no reducionismo se afirmássemos que as condições sociais foram às únicas responsáveis por atos muitas vezes cruéis dos bandoleiros.

A chacina de Canudos, assim como a dos cangaceiros, reflete uma mancha na nossa história, uma página sem brilho da qual não podemos nos orgulhar; parafraseando o escritor Euclides da Cunha ( S/d, 352): “É que ainda não existe um Maudsley para as loucuras e crimes da nacionalidade.”


FONTE: http://www.webartigos.com/artigos/o-cangaco-no-brasil/135711/

Enviado pelo professor, escritor, pesquisador do cangaço e gonzaguiano José Romero de Araújo Cardoso

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