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06 fevereiro 2016

UM POUCO DA BIOGRAFIA DO EX-CANGACEIRO MORENO


Antônio Ignácio da Silva (Tacaratu1 de novembro de 1909 — Belo Horizonte, em 6 de setembro de 2010), mais conhecido pela alcunha de Moreno, foi um cangaceiro pertencente ao bando de Lampião e Maria Bonita. Após a morte deste, fugiu de Pernambuco e adotou o pseudônimo de José Antônio Souto, fixando-se em Minas Gerais. Foi um dos integrantes do bando com maior longevidade, e um dos últimos a morrer.[1] [2]


Filho de Manuel Ignácio da Silva (o Jacaré) e Maria Joaquina de Jesus, Antônio perdeu o pai na adolescência, quando este foi morto pela polícia nas proximidades de São José do Belmonte, em uma suposta queima de arquivoExerceu a profissão de barbeiro, mas seu desejo era ser soldado da polícia. O sonho terminou quando foi preso e espancado por policiais de Brejo Santo, após ser acusado injustamente de roubar um carneiro. Libertado, matou o homem que o denunciou, que seria o verdadeiro ladrão.[3]

Durvalina e Moreno

Foi contratado por um proprietário rural para defender sua fazenda do ataque de cangaceiros, mas terminou integrando-se ao grupo de Virgínio, cunhado de Lampião, de quem tornou-se amigo. Na década de 1930 casou-se com Durvalina Gomes de Sá, a Durvinha. O casal teve um filho, que não pôde permanecer com o bando, pois seu choro poderia denunciá-los. A criança foi deixada então com um padre, que a criou.[1] [3] [4]

Moreno era conhecido por não gostar dos rifles de repetição americanos, muito usados na época e ter, a sua disposição, um mosquetão.[3]

Dois anos após a morte de Lampião, o casal fugiu para Minas Gerais. Por precaução, Moreno passou a chamar-se José Antônio Souto, e Durvalina tornou-se Jovina Maria. Estabeleceram-se na cidade de Augusto de Lima, e prosperaram vendendo farinha. Tiveram mais cinco filhos, e mudaram-se para Belo Horizonte no final da década de 1960.[5]

Ainda com medo de serem descobertos e mortos, mantiveram o passado em segredo até para os filhos. A situação manteve-se até meados da década de 2000, quando a existência do primogênito foi revelada. Encontrado em 2005, Inácio Carvalho Oliveira pôde finalmente reencontrar seus pais biológicos. Só então é que a família conheceu a história do passado no cangaço; Durvinha morreu pouco tempo depois.[2] [4] [5]

Deprimido com a morte da esposa, a saúde de Moreno passou a ficar cada vez mais debilitada. Ele morreu no dia 6 de setembro de 2010 em Belo Horizonte, aos 100 anos de idade. Durante o sepultamento foi realizada queima de fogos de artifício, a pedido do próprio Moreno, que pensou que nunca teria uma cova; o temor de morrer como um cangaceiro, decapitado e com o corpo deixado no mato, não o abandonou nos 70 anos que manteve seu disfarce.[2] [5]

https://pt.wikipedia.org/wiki/Moreno_(cangaceiro)
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OS BILHETINHOS DE LAMPIÃO

Por Raul Meneleu Mascarenhas

Mais uma reportagem interessante da série A AVENTURA SANGRENTA DO CANGAÇO, onde o jornalista Nonato Masson, da revista Fatos e Fotos, nos traz acontecimentos marcantes dos famosos bilhetes de Lampião, que gostava de emiti-los como estratégia para aterrorizar seus adversários e também poupar a si e a seus cangaceiros de um combate. Lampião tinha esse procedimento e quase sempre era atendido e quando recebia o dinheiro, passava, com seu bando, ao largo da cidade. Mas se não era atendido, ia buscar o dinheiro no peito e na raça e não tinha compaixão, depois dos saques, geralmente morriam pessoas, incendiava tudo e ia embora.


LAMPIÃO ficou alguns meses acoitado no pé da serra da Baixa Verde, perto da Vila de Patos, no Município de Princesa Isabel, sem que ninguém soubesse onde ele estava, tratando da sua bicheira — que é como chamava a ferida no calcanhar — com sumo do cipó de bilha-de-carne. Corria a notícia de que ele estava morto quando, à frente de cinquenta cabras, divididos em grupos de dez, numa madrugada de fevereiro de 1924, entrou na cidade de Sousa, cortando, antes, os fios telegráficos. Passaram ali dois dias, saqueando as casas comerciais e violentando as mulheres, até mesmo as velhas, sem encontrar qualquer resistência. Com bastante munição de bica (rapadura, farinha de pulsa, carne-de-sol e cabacinhas de água), além de grande quantidade de fósforos e fumo de rolo para fazer cigarros de palha, vestidos com as roupas novas que encontraram nas residências assaltadas, deixaram Sousa e, ao passar pela vila da Cabeça do Porco, um garoto chamado Vicente entrou para o bando, para carregar os teréns e os cobertores que tomavam dos soldados. 
  

Com esses cobertores faziam as camas para dormir nas caatingas. O garoto era preto como carvão, e vesgo, realçando o branco pálido do seu olho esquerdo. Logo Lampião o apelidou de Lua Branca. No caminho, Meia-Noite brigou com Lampião, acusando Livino e Antonio de lhe terem roubado dois contos de réis que tirara da burra de uma loja, em Sousa. — Gatuno duma figa — gritou Meia-Noite, sacando da peixeira pajeú e dando um pulo para trás —, pula pra limpo, que eu como um por um agorinha mesmo. Bando de ladrão safado, balé parece cigano. 

LAMPIÃO não gostava de confusão entre os seus cabras. Deu dois contos a Meia-Noite, apesar dos protestos de Antônio e Livino, que juravam com os dedos em cruz não terem roubado nada, e mandou que Meia-Noite sumisse de sua frente. Descendo o serrote de Colônia, Lampião atingiu com o seu bando o maciço da Borborema, de onde passou para Pernambuco e caminhou até Flores, na região do rio Pajeú. 

Um dos bilhetes escritos por Lampião, iniciado com a frase "estimo suas saudações". Não tendo certeza do ano, escreveu mais (+) ou menos (—) 1926. Neste bilhete, Lampião mandava pedir dois contos ao comerciante Antonio Mando. Lampião carregava sempre caneta de pena bico-de-pato, tinta é papel. Antes de qualquer ataque fazia bilhetes pedindo dinheiro.


Com medo de encontrar, no seu caminho, o bando de Lampião, o Governador Sérgio de Loreto, de Pernambuco, cancelou uma viagem que teria de fazer do Recife a Vila Bela. Lampião passou todo o ano de 1929 no sertão pernambucano, acoitado nas proximidades da fazenda de um coronel seu amigo, em Rio Branco, hoje cidade de Arcoverde. Nas feiras os cantadores louvavam Lampião e mangavam do governador:

Doutor Sérgio de Loreto, 
Govêrno de Pernambuco, 
Com mêdo de Lampião, 
Só falta ficá maluco. 

Ao entrar em território pernambucano, o bando de Lampião invadiu a fazenda Abóboras, de Manuel Neto, e, a seguir, entrou em Tapera, no Município de Floresta dos Navios, onde matou o subdelegado Manuel Jiló que, com cinco praças, lhe ofereceu resistência. Quando se esgotou a munição, Manuel Jiló tentou fugir, mas foi pego pelos cangaceiros e sangrado, juntamente com os soldados. 

MANUEL Neto, depois que a sua fazenda foi incendiada por Lampião, assentou praça na polícia pernambucana e passou a persegui-lo dia e noite. Numa das suas andanças pelos sertões de Pernambuco, Lampião encontrou um médico recém-formado, que ia de Jatobá do Tacaratu para Águas Belas, em visita à família, e o prendeu, levando-o pare uma grota. Seu calcanhar estava muito inflamado, pediu ao doutor para tratá-lo. Um cabra foi despachado para a vila mais próxima, a fim de comprar remédios. Em cinco dias de curativos, Lampião sentiu-se melhor e colocou novamente o médico na estrada, em caminho de casa. Deu-lhe quatro contos de réis. Há episódios de nobreza na vida criminosa de Lampião. Por exemplo: certa vez cercou a casa de um seu inimigo, que estava em companhia de um só homem, mas sustentou fogo contra o bando, que estava formado por cerca de trinta cabras, por muitas horas. A certa altura do tiroteio, Lampião gritou: — Vicente Moreira, hoje era o teu dia, cabra safado, mas tu é ome valente, e ome valente assim não se mata. Sai da toca e vamo fazê um acordo. 

VICENTE saiu do esconderijo e, em campo raso, fizeram um pacto de não-agressão mútua. Quando Lampião ia-se retirando, Vicente o advertiu que era cunhado de José Saturnino — o inspetor de quarteirão de Nazaré da Mata, que ele, quando garoto, matara-lhe o filho, em consequência da questão dos chocalhos de bode — e ponderou: — Se você atacá Saturnino, eu tenho de lhe ataco. Por via disso é mais mió se desfazê o trato, a mode eu não sou orne de traição. Lampião gostou da atitude de Vicente. Estendeu-lhe a mão. Disse: "Aceito o trato. Tou vendo que você é ome mesmo." E nunca mais brigaram, nem Lampião perseguiu mais José Saturnino.

Em janeiro de 1925, os cabras de Lampião, fardados de macaco (apelido que Lampião botou nos soldados de polícia, porque eles fugiam, à sua aproximação, pulando como macacos), entraram, pela madrugada, na vila de Custódia, no município pernambucano de Alagoa de Baixa. Esperaram amanhecer, formados na Praça da Matriz, para então começarem o saque. O encarregado da coleta de dinheiro foi o próprio Prefeito Leopoldo Mafra, que Lampião foi acordar com a ponta de seu punhal de cabo de prata. Na bodega de seu Rouxinol, Lampião parou para matar a sêde: — Me alcance um copo d'água, ome de Deus. Veio o copo com água numa bonita bandeja, carregada por um menino chamado Luis Cristóvão dos Santos, que é atualmente juiz de Direito na região do Pajeú. Lampião bebeu a água, colocou o copo na bandeja e, num gesto de ternura, passou a mão, de leve, nos cabelos do menino e disse-lhe: — Cresça, fedelho, pra pegá no pau-furado. 

PEDIU dinheiro e seu Rouxinol disse que não tinha, porque estava ajudando o vigário Leão Verzeri a reformar a Matriz. Bastou falar em igreja para que Lampião o deixasse em paz. Saiu e foi até uma farmácia, onde pediu uma meizinha boa pra dor de cabeça, e que o boticário fizesse curativos em dois dos seus cabras, que haviam sido baleados num combate, há dias. Feitos os curativos, Lampião tirou uma caneta de pena bico-de-pato, um bloco de papel e um grande vidro de tinta de dentro do seu embornal. Apoiou-se no balcão e escreveu um bilhete, que entregou ao boticário, dizendo que "com essa orde" nenhum cangaceiro, dali por diante, lhe faria mal: — É só mostrar o bilhete e tá agarantido. 

SUA LETRA ERA O SALVO-CONDUTO PARA QUEM QUISESSE CIRCULAR NA REGIÃO DOMINADA PELOS CANGACEIROS.

Verso e anverso de um cartão de visitas de Lampião, dado pelo cangaceiro como salvo-conduto ao Prefeito Joaquim Resende, de Santana de Ipanema (Alagoas). 

Nesse bilhete, Lampião avisa o fazendeiro Elias Barbosa que estava esperando seus cabras.

DEPOIS de um dia em Custódia, os cangaceiros saíram no rumo de São Caetano, na ribeira do Navio, cantando estes improvisos:

As môça de Custódia, 
São feia mas tem ação, 
Botam queijo e rapadura, 
No borná de Lampião.

As fôrça de Pernambuco, 
São um bando de urubu, 
Preseguindo Lampião, 
Que é fio do Pajeú. 

A mulé de seu Leopoldo, 
E mulé trabaiadera, 
Passa a noite trabaiando, 
De manhã já tem pra fêra.

Com intervalos de menos de quinze dias, Lampião e seu bando assaltaram Buíque e a vila do Algodões, a oito léguas de beiço de Rio Branco, onde passou três dias saqueando o comércio. Em Rio Branco passou um telegrama ao governador de Pernambuco, avisando que não mandasse macacos para combatê-lo, pois, do contrário, marcharia sobre o Recife, a fim de pegá-lo a unha. O governador, com medo, não tomou qualquer providência contra ele, que, sem ser incomodado, atacou Granito, Leopoldina e Cabrobó. 

NA fazenda Melancia, perto de Flores, Lampião entrou para castrar um velho de nome Zé Calu, porque soube que ele havia deflorado a filha. Depois assaltou Flores, onde os cabras Mansidão e Jurema mataram, com uma porção de facadas o chefe da família dos Teotônios, o velho José Teotônio, por saber que ele telegrafara ao chefe de policia, no Recife, avisando da sua presença ali. Ao sair de Flores, Lampião foi avisado por um coiteiro que havia uma volante paraibana no seu rasto. A volante era comandada pelo sargento Cícero Oliveira, irmão do Tenente Cícero Oliveira, que os cangaceiros haviam abatido nos contrafortes da Borborema. 


Balbina da Silva e Maria Marques, duas das inúmeras mulheres ferradas, no rosto, com as iniciais de José Baiano. Eram marcadas porque Lampião não gostava de mulher de cabelos curtos.

Caminhando para São João dos Leites, onde ficaria a salvo da volante, na fazenda do Coronel José Jósimo, que era seu amigo e protetor em Pernambuco, o bando de Lampião topou com os macacos em Tenório e abriu fogo. O sargento foi baleado e morto, mas a fuzilaria continuou, cada vez mais feroz, obrigando a Lampião bater em retirada, sem tempo para socorrer o seu irmão Livino, que havia caído numa grota com um balaço no peito.

LIVINO foi degolado pelos soldados, seu corpo abandonado aos urubus e sua cabeça, levada como troféu, foi espetada numa estaca de cerca de mandacaru entre Tacaratu e Jericató. Com a perda do irmão, Lampião passou a viver triste, deixou crescer os cabelos e adotou novos requintes de maldade com as suas vítimas. Passou também a dar ordens para que fossem marcadas, no rosto, com ferro em brasa, todas as mulheres que usassem cabelos curtos. O encarregado da ferra era o seu lugar-tenente José Baiano, e centenas de mulheres tiveram o rosto marcado com as suas iniciais JB. As tropas da polícia paraibana não deram mais trégua a Lampião. Perseguiam-no em todas as direções, o que o obrigou a atravessar a fronteira, entrando em Alagoas, no rumo de Mata Grande. Ao passar pelo cemitério de Santa Cruz do Deserto, Lampião entrou com os irmãos Antônio e Ezequiel, colocaram flores sabre a sepultura do pai e rezaram. Seguiram caminho, com duas volantes da Paraíba e uma de Pernambuco no rasto de suas alpercatas, de rabicho, sem saber que estavam sendo seguidos, e foram-se acoitar numa palhoça de taipa no lugar conhecido por Serrote Preto.


JUNTARAM-SE as volantes paraibanas e atacaram o coito de surpresa. A luta foi de papoco. Logo no início do choque caíram mortos Asa Negra, Guri e Corró, três cabras de Lampião. Foi quando, pela retaguarda das tropas paraibanas, apareceu uma volante pernambucana, comandada pelo Tenente João Gomes, atirando a três por dois. Estabelecida a confusão, os cangaceiros executaram uma das suas fulminantes reviravoltas, tomaram posição sabre uma serra e envolveram os soldados, que, a essa altura, lutavam entre si. Com a chegada da noite o fogo cessou, deixando mortos setenta dos cem soldados das duas volantes. Os mortos foram transportados em rédea para Mata Grande, onde os sobreviventes da carnificina tiveram de enterrá-los sem a ajuda de ninguém, pois toda a população havia abandonado a cidade.

EM janeiro de 1926, Lampião comprou uma fazenda em Barreiros, perto de Vila Bela, em Pernambuco. Dizia sempre que seu grande sonho era voltar a ser vaqueiro e criador de gado. Saindo um dia da sua fazenda encontrou um automóvel com três homens numa estrada. Eram o chofer e mais Pedro Paulo Mineiro, inspetor-viajante da Standard Oil Company, e fenício Vieira, viajante da Companhia de Cigarros Sousa Cruz, que iam de Triunfo para Vila Bela a negócio. Lampião fez o carro parar e pediu dinheiro aos viajantes, que lhe deram dezesseis contos de réis. Achou pouco e os prendeu. Fenício disse que podia ir a Vila Bela arranjar mais dinheiro. Lampião concordou, ficando com Pedro Paulo como refém. Deu três dias para Fenício e o chofer voltarem com mais dez contos e levou Pedro Paulo para a sua fazenda. Passaram-se os três dias e Fenício não voltou. Lampião, que se afeiçoara a Pedro Paulo, resolveu mandá-lo de volta até a vila de Betanha, com dois bilhetes: um para um comerciante seu amigo, intimando-o a levar o rapaz até a estação da Estrada de Ferro Great Western, em Rio Branco, de onde ele seguiria para o Recife, e outro ao governador interino de Pernambuco, Júlio de Melo, propondo, entre outras coisas, governar o sertão até Rio Branco, onde chegavam os trilhos da Great Western, enquanto o Governo do Estado ficaria mandando de Rio Branco ao Recife.

ESCREVER bilhetinhos era o fraco de Lampião. Antes de invadir qualquer cidade, mandava um deles para o delegado, juiz ou algum comerciante forte, solicitando muitos contos de réis. Seus bi-lhetes, escritos mais a tinta do que a lápis, co-meçavam sempre com a frase "estimo suas sau-dações", que lhe era peculiar.

ELE tinha desses requintes e se era atendido, recebia o dinheiro e passava, com o bando, ao largo da cidade. Se não era, ia buscar o dinheiro na raça e, então, não deixava pedra sôbre pedra. Depois dos saques, incendiava tudo. Foi assim em Caranaúba das Flores, onde o comerciante Antônio Mando recebeu um bilhete seu e não fez caso, nem mandou qualquer resposta. O bilhete foi este: "Ilmo. Sr. Antônio Mando. Estimo suas saudação com todos ofim desta para lhe pedir dois contos di reis — los passo isto sem farta agora e não mande que depois vai se sahir muito mal resposta pelo mismo portador sem mais, não falte olhe. Virgulino Ferreira, vulgo Lampião."

Em março de 1926, a Coluna Prestes atravessou o sertão de Pernambuco e marchava sabre o Ceará. Na sua fazenda em Berreiros, Lampião recebeu um jagunço do padre Cícero Romão Batista. O jagunço lhe deu o recado: que fôsse com urgência ao Juazeiro do Norte e levasse todos os seus cabras. 

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LAMPIÃO NA BAHIA

Luiz Ruben

O que a imprensa registrou na época em que Lampião agiu na Bahia. Resultado de aproximadamente 150 mil páginas dos jornais: A Tarde, Diário da Bahia, Diário de Notícias, Era Nova, O Imparcial, do período de 1928 a 1940. Este livro tem no seu início, o Jornal O Povo, de Fortaleza no Ceará, apresentando uma reportagem datada de 4 de junho de 1928, setenta e oito dias antes da decisão de Lampião entrar na Bahia. Esta matéria dá uma visão da situação do chefe cangaceiro e de seu exíguo grupo ao fugir para o nordeste baiano.

Textos transcritos com a ortografia atual. As palavras em inglês foram aportuguesadas ou traduzidas, para melhor compreensão. No final das matérias do ano 1928 e no final do livro iconografia apresentando páginas dos jornais e de recortes. As notícias que a imprensa publicava sobre Lampião tinham seu nome sempre grafado "Lampeão", como mostram as fotos. Os jornais também grafavam Virgulino, embora o registro de batismo e nascimento estejam grafados com (o) Virgolino.

As localidades que tiveram seu nome modificado ao longo dos anos também foram atualizados. As matérias publicadas sobre Lampião pelos diferentes jornais, com o mesmo assunto é uma prova do interesse que o público baiano começou a despertar quando da chegada de Lampião na Bahia. Manchetes abrangendo o período de 23 de agosto de 1928 até 28 de dezembro de 1929. A primeira foi divulgada pelo Jornal A Tarde em 23 de agosto de 1928 com a seguinte manchete “Quem é Vivo... O grupo de Lampião ruma para a Bahia”.

Verão que o secretário de segurança pública, senhor Madureira de Pinho, acusa o jornal Diário de Notícias de ser seu inimigo, dando assim uma cobertura das tropelias de Lampião, desfavorável ao seu governo, mas os fatos noticiados mostravam a ação de Lampião. Não existia um jornalismo investigativo sobre a presença de Lampião na Bahia, as matérias publicadas nem sempre eram assinadas pelos jornalistas, os periódicos da capital não focavam apenas as manchetes, mas também opiniões, comentários e editoriais.

Serviço

"Lampião conquista a bahia"-Luiz Ruben F. de A. Bonfim
Edição do autor - 422 págs.
Valor: R$ 35,00 + (Frete simples) R$ 5,00. Total R$ 40,00
Pedidos: graf.tech@yahoo.com.br
ou (75) 3281 - 5080

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05 fevereiro 2016

BEATA MOCINHA RELIGIOSA


Há controvérsia quanto à cidade de origem, de Joana Tertulina de Jesus, mais conhecida por Beata Mocinha. Alguns dizem ter sido Quixadá outros Jaguaribe, ambos municípios do Ceará, no final do século XIX .

Após ter sido adotada por João Mota e sua esposa, conhecida por, Dona Professora (nome atribuído a ela por ter sido a primeira a montar uma escola, paga pelo governo, naquela região), foi conduzida a Juazeiro Norte, Ceará. Poucos anos após a adoção, Dona Professora teria sido transferida a Quixadá. Tendo em vista a fragilidade da saúde da jovem Joana Tertulina, que nos seus 11 anos vivia tossindo e sofrendo hemoptises, Dona Professora ressentia-se dos riscos que a viagem causaria a frágil saúde da jovem adotada. O casal submeteu o impasse ao parecer do Padre Cícero, que prontamente dirimiu a questão, sugerindo ao casal deixar a jovem sob seus cuidados.

A índole conciliadora, da jovem Joana e seus dotes administrativos, a conduziria, em futuro próximo ao gerenciamento da casa de padre Cícero. Segundo o pároco Azarias Sobreira, durante decênios seria como um "..anjo de boa inspiração..." para o padre Cícero, em horas das mais aflitivas de sua existência. Era ela que conseguia que o padre tomasse os medicamentos prescritos pelo médico, convencê-lo a fazer as parcas refeições de cada dia, nos momentos críticos de sua saúde, era ela também, que impedia que a multidão, chegada de terras distantes e desejos de um contato com o padre Cícero entrasse de roldão casa adentro - eram homens e mulheres de todo o Nordeste. Joana, com sua capacidade de coordenar, sua voz firme e poder de comando, foi providencial na organização da vida econômica e administrativa do lar de Padre Cícero, assim como exímia zeladora de sua saúde.

O codinome Beata tem a ver com a realidade da época e da região. Nesse período não existia Congregação Religiosa de mulheres, alguns padres, naquela região, conferiam mantos, véus e hábitos de monja a jovens que desejassem consagrar a Deus a sua virgindade. E a essas moças eram dadas a qualificação de Beatas, através de cerimônia pública e vestidura de hábito. A jovem Joana Tertulina de Jesus, ainda jovem, passou a fazer parte desse seleto grupo.

Fonte: Wikipédia

A governanta e tesoureira do Padre Cícero

Aos 62 anos, a solteirona Mocinha assumira o papel não só de governanta e tesoureira, mas também passara a responder pela administração dos bens do padre Cícero.

Era ela quem recebia as esmolas e doações deixadas pelos romeiros, mas também quem cuidava da compra, venda e arrendamento de imóveis.

Mocinha autorizava procurações, consentia permutas, abonava doações, decidia hipotecas.

Nos arquivos do cartório do Juazeiro do Norte ficaria documentada a vultosa movimentação financeira feita sob a rubrica da beata. As cifras alcançavam a vultosa a várias centenas de contos de réis.

Até a empresa encarregada de fornecer a energia elétrica para o município de Juazeiro do Norte, cujo capital somava a pequena fortuna de sessenta contos, estava no nome de Mocinha.Também eram oficialmente dela o matadouro e uma usina beneficiadora de algodão, além de casas, prédios e sítios espalhados no Cariri. Embora se soubesse que todas as propriedades, em última análise, fossem de Cícero, era a beata quem assinava os papéis e respondia legalmente por elas.

Nada na residência do padre Cícero se fazia sem o consentimento da velha, o que inclusive lhe rendera o epíteto de "Mandona". Sempre vestida com o hábito escuro, dona de personalidade forte, a onipresente Mocinha administrava com rédea curta a rotina da casa.

Fonte: "Padre Cícero: poder, fé e guerra no sertão", Lira Neto, São Paulo, Companhia das Letras, 2009.

http://www.onordeste.com/onordeste/enciclopediaNordeste/index.php?titulo=Beata+Mocinha&ltr=B&id_perso=5295

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ABC DE LAMPIÃO

Por Raul Meneleu Mascarenhas

Como sabemos, algumas estórias sobre Lampião são desencontradas dos fatos reais. Nessa reportagem de Nonato Masson encontramos algumas disparidades com historiadores e pesquisadores do cangaço lampiônico. De qualquer forma, mesmo com algumas colocações diferentes, não deixa de ser literatura histórica mesmo tendo sido escrita muito depois da morte de Lampião. Aqui trago mais uma dessas matérias para os que gostam de estórias do cangaço.


NONNATO MASSON
escreve as reportagens da história
A AVENTURA SANGRENTA DO CANGAÇO
Seu rifle era a sua lei: tinha uma lampejante e mortífera capacidade de repetição. Daí lhe veio o apelido de Lampião

ABC DE LAMPIÃO
NUMA LUTA FEROZ ENTRE FAMÍLIAS FORJOU-SE O REI DO SERTÃO
Reproduções fotográficas de Nelson Santos e Juvenil de Sousa.


ATÉ 1912, o cangaço era um fato normal nos sertões do Nordeste. As façanhas de Lucas da Feira, Cabeleira, Jesuíno Brilhante e Antônio Silvino corriam de boca em boca, com sabor de lenda, a par de histórias que falavam dos jagunços do Bom Jesus Conselheiro e do padre Cícero Romão Batista, o santo de Juazeiro. Foi nesse ano que o Governador Castro Pinto, da Paraíba, tomou a iniciativa de uma convenção, para combater o banditismo entre os governos dos Estados de Pernambuco, Rio Grande do Norte, Paraíba e Ceará. Além da ajuda mútua, foram eliminadas as fronteiras entre os estados, podendo a fôrça policial de um penetrar em outro, sem qualquer pedido de autorização. Dessa convenção participariam depois os governos da Bahia, Alagoas e Sergipe. Assim, com o Nordeste sem fronteiras, as tropas volantes, que não seguiam um plano de combate pré-estabelecido, e sem um comando único, enfrentaram-se várias vêzes na suposição de estarem lutando contra os cangaceiros. No ano de 1914, após uma luta feroz em Taquaretinga, Manuel Batista de Morais, conhecido por Né Batista e por Antônio Silvino, e que há cérea de 20 anos era o rei do sertão, foi baleado e entregou-se ao Alferes Teofanes Tôrres. Prêso Antônio Silvino, os cangaceiros Casemiro llonório e Né Pereira refugiaram-se na ribeira do Pajeú das Flores, de onde passaram a comandar o cangaço em toda a extensão que vai de Pernambuco à zona baiana do rio São Francisco. 

BALEADO em Inhamuns, Ceará, por questões de terras, Antônio Alves Feitosa fugiu com o seu filho José Feitosa depois de ter morto um fazendeiro. Foi para Pernambuco, onde passou a viver como lavrador em Passagem, Distrito de Carqueijo. Morrendo o velho Feitosa, José, para se ,livrar definitivamente da polícia cearense, trocou o nome para José Ferreira da Silva, casou-se com Maria José Lopes e comprou uma fazenda em Ingazeira, às margens do riacho São Domingos, em Serra Vermelha, no Município de Vila Bela, hoje Serra Talhada. Da união de José com Maria, nasceram Antônio, Livino, Virgulino, João, Anália, Ezequiel, Virtuosa, Maria e Angélica. Virgulino Ferreira da Silva nasceu a 12 de fevereiro do ano de 1900, depois de Antônio e Livino. 

COUBE à avó de Virgulino, de nome Jocosa, mãe de Maria, criá-lo dos cinco aos doze anos de idade. Ela morava em Poço do Negro, onde, a seu pedido, o seu filho Manuel Lopes matriculou Virgulino na escola particular de Domingos Soriano e Justino Nenéu. Quando tinha doze anos e estava no terceiro ano primário, Virgulino abandonou a escola e passou a domar potros bravos, amansar animais no campo, ganhando logo a fama de ser um dos melhores vaqueiros do Pajeú. Aprendeu a fazer selas, gibões, arreios, perneiras, chapéus de couro, alforjes e embornais, que vendia nas feiras de Nazaré, São Francisco (atual Pajeú), Triunfo, Custódia e Salgueiro. Aprendeu com o pai a tocar sanfona de oito baixos. Tinha boa voz para cantar e muita inspiração para tirar toadas, repentes, baiões e xaxados. Uma das suas músicas, a toada "Muié Rendera", seria, tempos depois, o canto de guerra das suas guerrilhas pelos serrotes e pelas caatingas. 

DUAS famílias — a dos Pereiras e a dos Carvalhos, esta tendo os Nogueiras como aliados — travavam entre si uma luta fratricida, desde a revolução pernambucana de 1817, em torno da liderança política da região do Pajeú. O pai de Virgulino foi agregado dos Pereiras e por eles combateu. Um dia, depois de um combate com os Carvalhos, com Antônio e Livino feridos, teve de fugir de Serra Ver-melha, levando tôda a família, passando a morar perto da Vila de Nazaré, no Município de Floresta. Em Nazaré, Virgulino despontou para a aventura sangrenta do cangaço. 


Aconteceu assim: o filho do inspetor de quarteirão José Saturnino inventou que Virgulino lhe havia roubado uns chocalhos de bode. Preso por José Saturnino, de nada adiantaram os pedidos do velho José Ferreira e as declarações de inocência do acusado, que era então um menino de 16 anos. Seu pai e seus irmãos não tiveram outra alternativa: foram soltá-lo a bala. Era a lei do sertão. E dias depois, Virgulino, Antônio, Ezequiel e Livino surpreenderam o filho do inspetor e o mataram. Depois de morto, ainda foi sangrado no pescoço por Virgulino Ferreira, com uma faca pajeú. 



EM Mata Grande, para onde os Ferreiras se mudaram, alguns meses depois, unia tropa de cachimbos (nome dado aos civis contratados para perseguir criminosos) cercou, de surpresa, a casa do velho Ferreira, sob o comando do Cabo José Lucena — que era o delegado volante —, a pedido do inspetor José Saturnino, para prender Virgulino e seus irmãos. No ataque foi morto o velho Ferreira, quando debulhava, na cozinha, uma espiga de milho, e preso o seu filho João. Os outros escaparam porque tinham ido à feira vender bodes. A mulher de José Ferreira, vendo-o morto, caiu fulminada por um ataque do coração. 

FEITO o sepultamento do pai e da mãe, no cemitério de Mata Grande, Virgulino reuniu os irmãos e as irmãs e foi para Vila da Pedra, onde passou a trabalhar como comboieiro para o Coronel Delmiro Gouveia. Corria o ano de 1917. O Coronel Delmiro, que havia construído a primeira usina hidrelétrica no Nordeste, com a energia da cachoeira de Paulo Afonso, e montado a primeira fábrica de linhas da América do Sul, foi misteriosamente assassinado nesse ano, sendo o crime atribuído a elementos ligados aos trustes ingleses que moviam uma guerra sem quartel ao pioneiro alagoano. Sentindo-se inseguro em Vila da Pedra depois da morte do Coronel Delmiro, Virgulino deixou as irmãs e João — que não era bom da cabeça — aos cuidados da família de Raimundo Peba, operário da fábrica de linhas. E retornou à Floresta, com os irmãos, à procura do bando de Sinhô Pereira e Luís Padre.

GRANDE foi a surpresa de Sinhô Pereira ao ver, já homenzinhos e afoitos, os filhos do velho José Ferreira, que lutara ao seu lado contra os Carvalhos. Virgulino era quem liderava os irmãos e, por isso, passou a merecer mais atenção de Sinhô Pereira, que lhe deu logo uma espingarda papo-amarelo, novinha. Dias depois, após um choque com uma volante comandada pelo Sargento Optato Gueiros, Virgulino, todo cheio de si, disse a Sinhô Pereira que, no tiroteio com a volante, a sua espingarda não deixou de ter clarão, tal qual um lampião. Os cabras acharam muita graça e Luís Padre disse que não seria mais à falta de lampião, para iluminar os caminhos, que eles cairiam na tocaia das volantes. Desde esse dia Virgulino Ferreira da Silva passou a ser chamado de Lampião. E, da bôca da sua espingarda, trocada, anos depois, por um fuzil do Exército, que lhe foi oferecido por autoridades federais, jorrou um clarão, cuja luz, lívida e sinistra, iluminou por mais IS anos os sertões do Nordeste. 

HOUVE, porém, o seguinte: Sinhô Pereira e Luís Padre foram a Juazeiro do Norte, no Ceará, pagar uma promessa a padre Cicero Romão Batista e ali o velho taumaturgo os convenceu a abandonar o cangaço. Eles atenderam e seguiram, com recomendações do padre, para o interior de Goiás, deixando Virgulino e seus irmãos.

INDO a uma festa em Juazeiro, Lampião foi avisado por um beato do padre Cícero que o Deputado Floro Bartolomeu havia prometido ao governador de Pernambuco que o entregaria à policia. Disse-lhe o devoto não acreditar que o padre Cícero concordasse com a prisão, porque quem chegasse Juazeiro ficava garantido com a santidade mas que era bom tomar cuidado, porque "doutor Floro é homem capaz de tudo". 

JUNTANDO seus teréns, Lampião deixou Juazeiro, atravessou Pernambuco e chegou Alagoas, onde encontrou o bando dos irmãos Porcino, Antônio e Manuel, juntando--se a eles. Ficou com os Porcino, até junho de 1922. Nesse ano, os Porcinos decidiram abandonar o cangaço e, dos seus trinta cabras, vinte e um debandaram e nove ficaram com Lampião, que passou a chefia-los. Começou assim Lampião a sua carreira de chefe de bando, comandando doze cabras, inclusive seus três irmãos Antônio, Livino e Ezequiel. 

"LAMPIÃO é rapaz moço, pode ter vinte e dois ano. Tem cartucheira de prata e um rife americano."


MATINHA de Água Branca, em Alagoas, foi a primeira cidade que Lampião saqueou como chefe de bando. A frente de cinquenta cabras e com cerca de oitocentos soldados da polícia de três estados no seu rastro, entrou em Matinha de Água Branca sem dar um tiro. Distribuiu seus homens pelos pontos estratégicos da cidade e mandou Cravo Roxo intimar o delegado a fazer uma coleta de dinheiro entre o povo. A seguir, entrou numa igreja e foi rezar para o padre Cícero. Depois da reza, seguido pelas crianças que viam nele um herói, foi ao palacete da viúva Joana Vieira da Siqueira Tôrres, Baronesa de Água Branca, de onde levou todas as jóias que ela guardava em três grandes baús de cedro. Não molestou ninguém e saiu de Matinha de Agua Branca debaixo dos gritos das crianças: "Viva Lampião, Viva Lampião." Isso a 22 de junho de 1922. 

NO dia 6 de julho do mesmo ano, Lampião assaltou em Olhos d'Agua a fazenda do Coronel José Rodrigues, levando cinco contos de réis para deixá-lo vivo. Invadiu, a seguir, a Vila do Espírito Santo, e, após essas três investidas, foi-se acoitar numa grota em Tacaratu, onde passou cerca de seis meses sem dar sinal de vida.



"Ô muié rendá. ô muié rendá. Chorô por mim não fica. soluçô vai no borná. O Ceará tá de luto, Pernambuco de sentimento, Alagoa de porta aberta, Lampião xaxando dento." 


PARA fugir à ação das volantes, que passaram a não lhe dar trégua, Lampião permanecia durante meses num esconderijo, onde eram promovidos bailes em que a cachaça corria à solta. Ele mesmo animava os forrós, tocando sua sanfona de oito baixos e tirando toadas que se transformavam em cantos de guerra, como essa "Muié Rendera". Nos bailes, à falta de mulheres, os cabras dançavam uns com os outros, dias e noites seguidos. Lampião fumava pouco e bebia menos. Não gostava muito de cachaça: preferia vinho ou conhaque.

QUANDO pressentia ter-se afrouxado o cerco policial, mandava um dos seus cabras às feiras para assuntar o ambiente. Esses cabras eram os chamados pombeiros e muitos deles foram afastados do bando por Lampião, que lhes dava casa e sustento, mantendo-os como coiteiros, que eram os seus informantes sobre todas os movimentos da polícia. 

RECAIU sôbre os coiteiros, tempos depois, o segredo do terrível domínio de Lampião nos sertões do Nordeste. Em pouco tempo, ele conseguiu organizar e manter, do Ceará à Bahia, uma poderosa rede de espionagem, e até padres, juízes, comerciantes, coronéis de barranco, e mesmo soldados da polícia, uns por temor e a maioria por interesse, passaram a dar o serviço a Lampião. 

SOFRENDO de um glaucoma no olho direito desde que nasceu, Lampião passou a usar óculos a partir dos 22 anos. A cegueira total desse olho, que se manifestaria quatro anos depois, foi uma consequência natural do glaucoma. Segundo depoimento de seus cabras, alguns ainda vivos, ele costumava dizer que "dois óio é luxo", porque para fazer pontaria "basta só um; o outro inté atrapaia".

As ordens de Lampião eram cumpridas à risca. Não falava duas vezes, porque não era de conversa. Lampião gostava de romance de capa e espada, mas não largava o rifle, que era sua bengala. 


TINHA 1 metro e 80 de altura, cabelos pretos e escorridos, dentadura perfeita, braços finos e mãos compridas, cheias de veias intumescidas. Era amulatado e magro. 

UM punhal de 73 centímetros de lâmina, atravessado na cartucheira do cinturão, duas outras cartucheiras cruzando o tórax, dois embornais, onde carregava iodo, algodão, sabonete, pasta e escova, um prato de alumínio, duas pistolas "parabellum", um rifle com a bandoleira enfeitada de libras esterlina e antigas moedas de ouro portuguesas, e enrodilhado na cintura o cofre papo-de-ema, a sua burra portátil, cheia de cédulas — esse equipamento, pesando cerca de quarenta quilos, era o de Lampião, que vestia invariavelmente paletó de brim caqui e calça de riscado,  lenço vermelho ao pescoço e calçava alpercatas de couro cru e meias de cores vistosas. Usava óculos de de aros de ouro, vários anéis nos dedos, sendo um deles de médico, medalhas do Padre Cícero e Nossa Senhora das Dores e rezas fortes costuradas em panos bentos. Na cabeça, um grande chapéu de couro de viado, batido na frente e atrás, destacando-se, na testeira, um signo-de-salomão colorido de ilhoses. 

VENTANIA, Cobra Verde, Cravo Roxo, Azulão, Criança, Pancada, Maria, mulher de Pancada, Carrapicho, Cobra de Cipó, Asa Branca, Pinto Cego, Come Cru, Patorí, Marreco, Graúna e Mergulhão foram os cabras que formaram o primeiro bando de Lampião.

XEXÉU, Chá Preto, Besta Fera, Canjica, Jurema e Beija-Flor entraram a seguir. Era ele que os apelidava, com o objetivo de lhes esconder a verdadeira identidade, a fim de livrar a família de cada um das represálias da polícia. Ezequiel, seu irmão, apelidou de Ponto Fino, porque ele era mesmo o fino na pontaria.

ZABELE entrou para o bando de Lampião em 1923. Era um caboclo que vivia repinicando a sua viola nas feiras dos sertões de Alagoas. Um dia, tirou um repente criticando arbitrariedades do delegado de Santana de Ipanema. Foi preso, espancado a chicote de umbigo de boi e marcado a ferro em brasa, pelos soldados, como novilho em curral. Conseguiu fugir da prisão e foi juntar-se ao bando de Lampião. Era sempre assim. Para os injustiçados nos sertões do Nordeste, Lampião era a última instância. 

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REVENDO - LAMPIÃO CONCEDEU UMA ENTREVISTA E CONTOU COMO SE FEZ BANDOLEIRO

Por Antônio Corrêa Sobrinho

AMIGOS,

O que dizer desta publicação de “O Globo”, edição de 16 de maio de 1927, senão que intrigante e questionadora?

Este importante jornal, em 1926, conforme pude observar, nada disse a respeito da famosa entrevista concedida por Virgulino Ferreira, Lampião, ao senhor Otacílio Macedo, tudo sob o auspício do padre Cícero Romão Batista, exatamente na ocasional da visita do cangaceiro a Juazeiro com o objetivo de receber a prometida patente de capitão do Exército, e a incumbência de ajudar no combate à Coluna Prestes. Para, mais de um ano depois, trazer a lume a matéria que acabo de descobrir, alardeando tratar-se da Entrevista que Lampião concedera na terra do padre Cícero, à inominada pessoa, e sob patrocínio deste chefe político e reverenciado vigário.

Ora, se não consta da historiografia do cangaço que Lampião, no ano seguinte de 1927, estivera mais uma vez com Padre Cícero, o que podemos dizer deste intempestivo artigo do diário carioca? Estaria "O Globo" querendo dizer aos seus leitores ser esta a autêntica entrevista de Lampião dada no Juazeiro, ou apenas se referir à famosa entrevista de Lampião, publicada no jornal “O Ceará”, nos dias 17 e 18 de março de 1926, de cujo conhecimento eu presumo o grande jornal do Sul saber, entrevista esta, a por nós conhecida, dada ao sobredito Otacílio, matéria que, por sinal, só voltou a ser republicada nas décadas de 1970 e 90, mesmo assim, com as palavras ditas por Lampião adaptadas à linguagem convencional pelo renomado escritor Nertan Macedo, segundo leio.

Gostaria, por fim, de dizer que, em relação à informação de “O Globo” de que sua postagem é uma reprodução de publicação do “Jornal de Aracaju”, salvo melhor informação, este extinto jornal sergipano teve seus dias nos idos do século XIX, portanto não poderia ter publicado tal artigo; e que desconheço, nos jornais sergipanos dos anos de Lampião, especialmente o “Correio de Aracaju” (porque o único que se assemelha no nome ao citado "Jornal de Aracaju"), alguma coisa neste sentido.

À consideração e apreciação dos amigos.

"O GLOBO" - 16/05/1927 - LAMPIÃO CONCEDEU UMA ENTREVISTA E CONTOU COMO SE FEZ BANDOLEIRO

Nos domínios do padre Cícero.

O “Jornal de Aracaju” publica, em sua edição de 5 do corrente, a seguinte entrevista, obtida do célebre bandoleiro dos sertões do Nordeste, denominado “Lampião”.

Juazeiro:

A multidão se aglomerava. O jornalista estranho ao meio interrogava a população adventícia.

- Qual a razão desse ajuntamento?

- É Lampião, senhor, que está na terra.

- “Lampião”?!

- Sim.

- Onde?

- Na casa do padre Cícero.

O terror lampionesco, se bem tenha afastado os jornalistas pusilânimes, não foi bastante para desviar a curiosidade do jornalista estranho. Fomos para lá.

“Lampião saíra há dois minutos da residência do patriarca de Juazeiro.

Dirigimo-nos ao reverendo; e, depois dos cumprimentos protocolares, abordamos o assunto.

- Então, reverendo, é certo que “Lampião” se encontra aqui?

- Sim, meu filho. Por uma razão de hospitalidade, sem procurar acoitar bandidos, fui obrigado a franquear esta cidade à sua entrada (!).

- Seria difícil, reverendo, falar a esse homem?

- É fácil, meu filho, contanto que não lhe peça entrevistas.

- ? ?

E o reverendo, curvado, o ombro penso, mostrou-nos o sobradinho onde estava Lampião. Para lá fomos.

Lá chegados, a imagem de um arsenal guerreiro se patenteava aos olhos curiosos.

Entramos. A escada íngreme, estreita e longa nos extenuara. Chegamos ainda sob a impressão das tragédias passadas em que a arma dos bandidos levava de roldão a vida, o sossego e a conservação das famílias.

Estacamos de pronto.

Um caboclo de estatura mediana, lenço grande e vermelho em forma de gravata, com um anel fazendo o laço, dedos cheios de brilhantes, roupa caqui, cintada à “touriste”, óculos, para nós se dirigiu, ar espantado, tímido e como que receoso...

- Coronel “Lampião”! – dissemos, por ter distinguido pelo aparato com que os asseclas o cercavam.

Depois de um “shake hand” sentamo-nos.

- Estivemos, agora mesmo, em casa do padre Cícero e, mostrando nós desejo de conhecer sua pessoa, disse-nos ele que poderíamos vir falar-lhe, adiantando, porém, que nós não pedíssemos uma entrevista, por ser contra o seu gênio concedê-la a jornalistas.

- Sim! Os homens dos jornais não dizem a verdade.

O doutor carcule que o meu nome, hoje, está explorado de tal forma que, se eu faço dez (textual), dizem que eu fiz cem.

- Mas, no fim de contas, nós queríamos tão somente uma palestra, de cuja discrição não abusaremos.

- Sendo assim, eu só poderei ser grato a V. Ex. (sic).

- Como começou sua vida armada?

- Ah! Foi uma tragédia. Calcule o senhor que éramos uma família pacata. Nunca fôramos incomodados pela polícia. 
Um dia, por umas questões de terras, fomos obrigados, eu e meus irmãos a agir de pronto. Houve luta, e da luta saíram três feridos e um morto. Eu fui o mais perseguido por ter “estirado” o que morreu. Homiziei na casa de um fazendeiro conhecido. A polícia soube e foi lá buscar-me. Eu estava na roça, e o fazendeiro, por ser amigo, negou que eu ali estivesse acoitado. Quando cheguei, após a retirada da polícia, 25 praças comandadas pelo tenente Rangel, o fazendeiro me disse que para não se reproduzirem tais cenas era conveniente que eu me retirasse. Desde então começou a minha vida errante. Ora aqui, ora ali, sempre só, fugindo dos lugarejos onde havia quarteis; levei uma temporada de um ano e tanto. Depois, encontrando outros que tinham crimes e andavam também foragidos, juntei-me a eles e fizemos o primeiro grupo composto de nove homens. Arranjamos rifles e saímos, depois de termos bebido muito, e saquearmos uma população onde não havia soldados. Ali exigimos pela força, de uma família, cujo chefe se chamava Pedroso, um conto de réis. Ele não tinha essa importância e nos deu trezentos mil réis, dois cavalos e uma vaca que adiante vendemos por noventa mil réis. Distribuímos entre nós o dinheiro, e continuamos a nossa marcha. Nas proximidades de Afogados de Ingazeira, num rancho, em conversas, descobrimos que ali estavam dois criminosos de morte, Sabino Pinto e Joãozinho, justamente dois “cabras” de minha confiança.

- E ainda andam consigo?

- Sim, o Sabino é este que está nas costas do doutor.

Olhando para trás, vi, com a mão apoiada no espaldar da minha cadeira, um tipo alto, forte, trigueiro, bigodes grandes e espessos, fisionomia fechada, sério e carrancudo.

- Mas, coronel Lampião, porque não deixa essa vida?

- Por que não deixo? 
Pois se os governos me perseguem? O que se dá comigo já se deu com Antônio Silvino. O homem queria deixar a vida do cangaço, queria trabalhar, mas os governos não consentiram. É justamente o que se dá comigo.

- Sim, nos Estados do Norte.

- Porque não vai o coronel para o Sul, disfarçadamente? 
Era melhor: descansavam o povo, os governos, a sua família e a sua vida também.

- Não! Enquanto eles me perseguirem, esses tenentezinhos de polícia, eu não descanso. Ou morro ou mato.
Era um dilema terrível. Levantamo-nos. À saída, ouvimos um rumor na escada que levava ao sótão. Era uma romaria que subia. Aguardamos sua chegada. 

Vencendo os últimos degraus que levavam ao sobradinho, tirou do seio uma moldura tosca, com uma moldura tosca, com uma imagem estranha e falou:

- “Seu” coronel, eu queria que o senhor me comprasse esta santa.

Lampião pegou da moldura, olhou-a, virou-a, e disse?

- Obra milagre?

- É muito milagrosa. É Nossa Senhora das Vitórias. Quem tem esta santa, bala não entra no corpo, inimigo não o vence.

- Quanto custa, perguntou Lampião?

- O coronel dá o que quiser.

Metendo a mão no bolso das calças o bandido retirou dali um maço de cédulas e separando uma de 50$000 deu à romeira. 
Ficamos estáticos, diante, não da prodigalidade, senão da quantidade de dinheiro que o bandido carregava consigo. Tinham-no em todos os bolsos, em avultadas somas.

Despedimo-nos e regressamos à casa do patriarca de Juazeiro.

Beata Mocinha

Lá chegados batemos à porta, fechada, contra a invasão dos romeiros. Veio abrir-nos a porta a beata Mocinha, depois de termos, em uma placa de níquel colada à fechadura da porta, batido com uma moeda.
- O reverendo está ocupado?
- Não, senhor, pode entrar.

Entramos.

Duas mocinhas sentadas em frente às máquinas de escrever, tratavam da correspondência do padre.

Passados instantes apareceu o reverendo.

Contamos a nossa palestra com Lampião e dirigimos a conversa para o caso em foco, qual fosse a candidatura do senhor Juvêncio Sant’Ana, juiz de direito local para deputado federal, candidatura esta imposta pelo patriarca, mas repugnada pela coligação dos partidos democrata e conservador.

O velho padre, pensativo, após nossa estranheza sobre o motivo por que não fora aceita a candidatura de seu amigo, rematou, num tom sentido e triste:

- O senhor já leu a fábula Fedro?

- Sim, Reverendo.

- Pois eu, hoje, sou como o leão de Fedro, quando me manso se tornou cordeiro até os burros lhe deram couces.

E ficou em atitude contemplativa e vaga, ombro penso, como a gozar ou a sofrer o conceito e a moralidade dessa história...”

Fonte: facebook

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MORRE LINDOMAR CASTILHO, REI DO BOLERO CONDENADO POR FEMINICÍDIO.

  Por Tâmara Freire - Repórter da Agência Brasil Publicado em 20/12/2025 - 12:10 Rio de Janeiro Morreu neste sábado (20), aos 85 anos, o can...