*Rangel Alves da Costa
Nada de novela, nada de ficção. A trama é tão real que dói na pele, nos ossos, em tudo. O enredo é tão dramaticamente pujante que só vendo cada cena em ação para se acreditar. Mas tudo existente num paraíso. Este sim, fictício, inventado por quem não conhece de perto as durezas da realidade da vida.
Brasil, este imenso e fictício paraíso. Se no passado o escrivão Caminha relatou que aqui se plantando tudo dá, vez que a riqueza da terra era avistada além do olhar, talvez só tivesse esquecido que se deveria plantar o grão produtivo e não semear ervas daninhas por todo lugar. E o que se espalhou foi a semeadura do imprestável.
Com as devidas desculpas ante as almas boas sempre existentes, semeadura do imprestável e com aparência de verdadeiro jardim. Tamanho é o disfarce existente neste paraíso que muitos acreditam ser coisa do outro mundo. Não se pode negar, contudo, a pujança das belezas naturais, das raças e das grandezas que conseguiram vingar mesmo na terra assolada pela desonra humana.
Neste aspecto, o Brasil é coisa de cinema. Os fascínios e os encantos se alargam por todos os quadrantes. Sua dimensão continental faz espalhar tamanha riqueza histórica e natural que se avoluma em maior intensidade em cada região que se tem. Da Amazônia ao Nordeste, segundo suas próprias feições, tudo é uma só beleza. Costas incomparáveis, serranias majestosas, pampas de inigualável nobreza.
Desse modo, que não se imagine que ora se nega toda a pujança que há sobre a terra brasilis. As riquezas são imensas, os recursos naturais são primorosos, os feitos históricos são exuberantes e há, verdadeiramente, uma grandeza única desde suas margens aos seus sertões. E como já disse alguém, tão rico e tão primoroso é o Brasil que tudo já fizeram para devastá-lo e jamais conseguiram. Com efeito, quanto mais tentam afundar o país mais ele emerge com a mesma grandeza.
Contudo, se na história, na geografia e na cultura, dentre outros aspectos, estão os exemplos maiores da riqueza e da diversidade brasileira, muito diferente ocorre quando o país é avistado perante o contexto humano, social e político. Em tais aspectos, e sem a menor dúvida no reconhecimento, há o que se pode chamar de o outro lado do paraíso. E assim por que os aspectos citados refletem bem o quanto a pátria é maltratada pela ganância humana, pela sociedade inerte e preconceituosa e, principalmente, pelo metiê que envolve a política, os políticos e os partidarismos.
Desde sua descoberta que o paraíso tropical se viu entregue aos descalabros humanos. Aquelas raízes dos segregados lusitanos, com toda espécie de gente mau caráter, aqui se disseminaram de tal modo que suas práticas e costumes escusos nunca mais deixaram de existir. Ladrões, espertalhões, gananciosos, tudo foi vingando em levas e fazendo surgir gerações que não mais deixaram de esbulhar, de usurpar, de roubar a nação.
Os exemplos primeiros se alastraram nos acertos dos poderes, na política, no mando, num mundo de espertezas. Significa dizer que aquela beleza avistada por Caminha passou a ser habitada e conduzida por mãos e mentes tão hábeis na ilicitude que o normal da existência passou a ser o de tirar o máximo proveito sobre tudo que a mão pudesse alcançar. E tal proveito da usurpação mesmo, do esbulho, da mão grande sobre bolsos e cofres.
Aquele paraíso, então, foi se transformando de tal modo em lugar de espertalhões que até hoje se disputa para saber quem rouba ais, quem é mais corrupto, quem é mias improbo. As provas estão aí. Um Brasil tão belo e tão feio pela raça corrupta que tomou conta dos parlamentos, dos gabinetes, das salas e antessalas. Um país que passou a se prezar pelo maus uso dos recursos públicos, pelas espertezas do poder, pelos processos criminais que se avolumam e pelas prisões que passaram a recair sobre os figurões da República.
Eis o outro lado deste paraíso chamado Brasil. Ou tristes trópicos, como diria Levi-Strauss. Uma nação que infelizmente se contenta em conviver com os mais nefastos disfarces: da seriedade que nunca existiu, da honradez vergonhosa de seus governantes e políticos e doo respeito ao próximo sob a máscara do preconceito e da discriminação. Assim, um lado que é belo e outro que é vergonhoso.
Escritor
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