Por Joel Reis
A numerosa família Pedro habitava um quarteirão inteiro da Rua da Conceição, em Juazeiro do Norte – CE. Constituída por Mané Pedro, Chico Pedro, Antônio Pedro, João Pedro, Joaquim Pedro, outros Pedro e Zé Pedro; o mais velho dos irmãos e chefe da família. Eram homens do trabalho, uma família de lavradores de mandioca no chapadão do Araripe, mercadores de cereais das feiras do Cariri, artífices carpinteiros, sapateiros, ferreiros... Viviam com certa prosperidade em terras que para viver é preciso ter coragem.
A família Pedro não era de levar desaforo para casa. Mesmo no modo de vida pacato que levavam os Pedro mostravam coragem a cada passo, depressa se habituaram à luta.
Zé Pedro, ora carrancudo, ora alegre e risonho, possuía muita força vital, corpulento, estatura alta, cabeça chata, cabelos encarapinhados, face, boca, dentes e orelhas regulares, aliás, não tinha nenhum outro estigma físico aparente de degenerescência. Usava chapéu de couro grande e quebrado na testa, um rifle, um revólver, um punhal, duas cartucheiras e um saco de bala. Apesar da valentia era um cangaceiro de atitudes nobres, não tomava dinheiro à força, não matava por perversidade, não desonrava e não incendiava. Um cangaceiro destemido, que só brigava, ou quando provocado ou por questões políticas. Não tinha preocupação nem vaidade.
Em 23 de janeiro de 1914, Zé Pedro liderou mais de 40 homens, entre eles seus irmãos, no ataque ao Crato – CE. Insultaram a tropa de guarnição da cidade, para fazê-la gastar munição, mas não se contentaram. Zé Pedro tomou a trincheira do Barro Vermelho, a do Fundo da Maca e a da Praça do Rosário, arrebentou as grades da cadeia do Crato e restituiu a liberdade ao famoso Zé Pinheiro. Em vinte horas de fogo tomou a cidade. Assim, a Revolução de Juazeiro do Norte sagrou-se vitoriosa.
Certo dia, Zé Pedro em uma bodega a beber, alguns soldados o quiseram prender. Raimundão um soldado valente e desordeiro, foi quem lhe deu a clássica voz de prisão: “esteje preso”. Antes não o fizera porque certamente, pela primeira vez, sua cabeça sofreu a consequência da sua ousadia, do seu atrevimento de querer prender o mais valente dos Pedro. Uma forte bofetada estalou-lhe tão pesada no ouvido, que Raimundão baqueou, pesadamente, no solo. Fechou o tempo. Cerca de quinze soldados eram presentes. Naquele momento, a única arma de Zé Pedro era um punhal de três palmos. Era quanto bastava. Como, porém, não era perverso, preferiu apenas abrir alas... Com o punhal traçou uma circunferência, colocou-se de pé no centro dela e bradou:
- Ô macaco! (é assim que os cangaceiros chamam os soldados) Quem pôr o pé neste risco, morre... (e morria mesmo).
Os soldados tinham plena certeza disso. Assim, acharam melhor dar por findo o incidente e continuar a beber com Zé Pedro. Com um cangaceiro valente, não procede de outra forma a polícia dos Sertões.
Outro fato se deu na chapada do Araripe, local onde havia uma grande plantação de mandioca, e os criadores de Pernambuco acharam que deviam fazer solta de seu gado na lavoura dos romeiros do Padre Cícero, os desbravadores e cultivadores daquela serra. O governo de Pernambuco, diante da reação dos romeiros, mandou para aquela serra uma força de polícia para garantir o gado dos criadores do seu Estado, na destruição da lavoura dos agricultores do Cariri.
Zé Pedro e seu amigo inseparável Mané Chiquinha foram ao encontro da tropa. E no fogo da Taboca, do embate dos dois com o exército pernambucano, resultou sair ferido um porco, o qual, morrendo depois. O oficial comandante se apressou em indenizar o respectivo dono! De certo, para Recife, a história foi contada de modo a realçar a correção do oficial comandante da tropa que enfrentou dois cangaceiros e matou um porco! Tem sido dessa ordem as providências dos governos do Norte, na repressão ao banditismo.
Zé Pedro bem que podia ter chamado a serra Zé Pinheiro e seus homens que estavam garantindo o gado na destruição da lavoura dos pobres. Teria assim feito diminuir, um pouco, a calamidade da seca de 1915, prestando mais um grande serviço ao Estado, mas não quis chamar. Os ousados camaradas inseparáveis, Zé Pedro e Mané Chiquinha habituados às grandes caminhadas iam pela mata densa da chã, até chegar à vereda estreita por onde os soldados eram forçados a passar. Escondidos em cima de uma árvore, um deles atira, de repente, o estrondo causa pânico e o terror assola a soldadesca que correu pelos matagais da chapada.
Mesmo diante do perigo, Zé Pedro zombava de tudo, nada temia. Depois, vitorioso, admirado por todos, não se gabava de seus feitos, não reclamava glória para si e muito menos se mostrava superior a nenhum companheiro. Havia homens assim naquele meio e não tinha como saber exatamente os motivos que os tornaram cangaceiros. Não são criminosos natos, não fazem profissão do crime, nem mesmo têm instintos perversos.
Zé Pedro era um desses, nas ocasiões em que lhe ofereciam dinheiro para matar alguém, não aceitava; ou às vezes aceitava, mas não matava. Em tom de brincadeira, contava depois a história ao que devera assassinar, sem, contudo, dizer quem fora o mandante. Quando pediam para atear fogo em uma propriedade, não executava tal pedido e ainda avisava o proprietário que se precavesse.
Segundo Antônio Xavier de Oliveira (1920) houve cangaceiros assim, que não eram tão maus como se pensa e se diz. Como Zé Pedro alguns eram honestos, valentes e nobres, pois, piedade para eles. Em vez de bala e cadeia, um livro e uma escola.
REFERÊNCIA
XAVIER, A. de Oliveira. Beatos e Cangaceiros. Rio de Janeiro: [s.n.], 1920.
NOTAS
*José Pedro se destacou como chefe de grupo na revolução do Juazeiro de Norte – CE, em 1914. O bando de José Pedro era formado por irmãos e amigos, os Pedro, atuou em torno da chapada do Araripe nos primeiros anos do século XX, até ser assassinado pela polícia do Crato – CE, em maio de 1924.
*José Pedro se destacou como chefe de grupo na revolução do Juazeiro de Norte – CE, em 1914. O bando de José Pedro era formado por irmãos e amigos, os Pedro, atuou em torno da chapada do Araripe nos primeiros anos do século XX, até ser assassinado pela polícia do Crato – CE, em maio de 1924.
* A foto de Zé Pedro também aparece nas seguintes obras:
FACÓ, Rui. Cangaceiros e fanáticos. 3ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1972. (A foto de Zé Pedro aparece na p. 14, mas apenas na versão impressa, a versão em PDF que está disponível na internet não possui fotos).
MELLO, Frederico Pernambucano de. Guerreiros do Sol: violência e banditismo no nordeste do Brasil. 5 ed. São Paulo: A Girafa. 2011. (A foto de Zé Pedro aparece na p. 399, mas com apenas uma legenda simples na p. 398).
OLIVEIRA, Aglae Lima de. Lampião Cangaço e Nordeste. Rio de Janeiro: Edições O cruzeiro, 1970. (A foto de Zé Pedro aparece na p. 37 com apenas a legenda “Zé Pedro, Fanático do Crato”).
XAVIER, A. de Oliveira. Beatos e Cangaceiros. Rio de Janeiro: [s.n.], 1920. (A foto de Zé Pedro aparece na p. 86).
P.S. O único livro que encontrei falando sobre o tema supracitado foi o “Beatos e Cangaceiros (1920)” de Antônio Xavier de Oliveira que nasceu em Juazeiro do Norte (CE).
MELLO, Frederico Pernambucano de. Guerreiros do Sol: violência e banditismo no nordeste do Brasil. 5 ed. São Paulo: A Girafa. 2011. (A foto de Zé Pedro aparece na p. 399, mas com apenas uma legenda simples na p. 398).
OLIVEIRA, Aglae Lima de. Lampião Cangaço e Nordeste. Rio de Janeiro: Edições O cruzeiro, 1970. (A foto de Zé Pedro aparece na p. 37 com apenas a legenda “Zé Pedro, Fanático do Crato”).
XAVIER, A. de Oliveira. Beatos e Cangaceiros. Rio de Janeiro: [s.n.], 1920. (A foto de Zé Pedro aparece na p. 86).
P.S. O único livro que encontrei falando sobre o tema supracitado foi o “Beatos e Cangaceiros (1920)” de Antônio Xavier de Oliveira que nasceu em Juazeiro do Norte (CE).
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