Clerisvaldo B. Chagas, 2 de novembro de 2018
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 1.998
Dona Zifina cortava flandres. Fazia candeeiro. Seu Tô, com chapéu raro de Polícia Montada, retelhava casas; Salvino consertava sombrinhas; Silvino manejava o serrote: roc-roc; Pé-Espaiado era ferreiro; Zé Gancho trabalhava o Zinco; Otávio Magro vendia carne-de-sol e Dona Maria Néris rezava o ofício de Nossa Senhora. Manezinho Quiliu, vindo de Olivença, mexia com bicas; Gérson batia sola; Maria Lula vasculhava casa; Zé Preto negociava bugigangas; Seu Né cubava terras; Flora vendia esteiras; Seu Antônio e Seu Quinca eram alfaiates e, finalmente, Zé Limeira fazia malas. Não éramos uma Grécia, mas bem que a Rua Antônio Tavares e arredores funcionavam como tal.
CANDEEiRO. (FOTO: ANALISE AGORA). |
Josefina, dona Zifina, de voz metálica e artesã dos flandres, confeccionava candeeiro, canecos, aros de óculos: Rats, rats, rats, trabalhava a tesoura pesadona nos dedos ágeis da avó de Oscar Silva, futuro escritor. E numa terra que passou quatro anos no escuro, o candeeiro, a placa, a candeia, eram bênçãos divinas nas noites tremendamente escuras do Sertão. Santana do Ipanema precisava do Ferreiro, era ali pertinho. O sapateiro, o barbeiro, o menino de recado... Tudo estava ao alcance de um grito forte de sertanejo. E assim deslizava o tempo tão devagar quanto o carro de boi de Lero Carreiro. E quando o vento forte fazia redemoinho, a meninada encintava o vento: “Rapadura! Rapadura!”.
Durante as noites de lua, gente nas calçadas enroladas em lençóis, contando histórias de Trancoso, de almas penadas, fazendo adivinhações, identificando as estrelas. O ferro em brasa nas janelas, levando as cinzas do carvão. Candeeiro aceso na força do querosene, do gasóleo. Aqui, acolá, a passagem tardia de um malandro de jogo; um sopro forte no ferro de engomar; Uma golada d’água da quartinha com tampa de pano bordado, na janela tomando fresca.
Benditas mãos que confeccionavam as candeias de latas e nos tiravam do escuro.
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