Por Sálvio Siqueira
Naqueles idos de 1925 ocorreu um fato interessante donde relaciona a historiografia cangaceira, fenômeno exclusivo no Nordeste brasileiro, com a historiografia nacional quando, comandados por oficiais do Exército Brasileiro rebelados, Luís Carlos Prestes, Isidoro dias Lopes, Siqueira Campos, um contingente enorme, coluna militar, parte do Rio Grande Sul para levar suas ideias pelos sertões de Brasil afora, com intuito de derrubar o Presidente da República, a época, Arthur Bernardes, e, segundo alguns, mudar, modificar, alterar a ordem que vigorava no país naquele momento, ficando conhecido como os “Revoltosos”, então o referido chefe da Nação cria, ou recria, os Batalhões Patrióticos – BT.
O Exército Brasileiro, assim como o restante dos Exércitos dos países mundiais, tinham sua maneira, modos operante de combate que, tendo, por exemplo, a I Guerra Mundial, seria a ação de defesa e ataque a partir das trincheiras. Em outras palavras, a tropa atuava sem movimentos e em um campo, locais, determinados. Contrário a essa maneira de agir, que sabida, conhecida, pelo QG dos “Revoltosos”, os mesmo passam a executar a ação de Guerra de Movimentos, pois, sabiam que empregando suas ações com movimento de guerrilhas, as chances de saírem vencedores das batalhas eram enormes.
Pois bem, não havendo mais tempo para se estruturar tropas, formar contingentes, com essas definições de combate, Guerra de Movimentos, o governo federal adota o lema de que ‘combater fogo com fogo’ seria o ideal. Então, envia pessoal, no caso um Deputado Federal pelo Ceará, Floro Bartolomeu, médico baiano, que havia atuado como ‘comandante’, chefe, da jagunçada, organizado um movimento sedicioso, na Sedição do Ceará em 1914, ao lado do Padre Cícero, quando ocorre a derrubada do então governador daquele Estado, Franco Rabelo, a incumbência de estabelecer, criar, um Batalhão Patriótico na cidade de Juazeiro do Norte – CE, e dar combate aos “Revoltosos”.
Não foi exclusividade de Floro, tão pouco de Juazeiro do Norte, terem sob comando uma sede de um BT. Inclusive foi a tropa de um deles, o Batalhão Patriótico de Diamantina, comandado, chefiado, por Horácio de Matos, que colocou a coluna dos “Revoltosos”, Coluna Prestes, em fuga a perseguindo além-fronteiras boliviana. Porém, esse é outro assunto que em breve falaremos sobre ele.
As tropas dos Batalhões Patrióticos foram formadas por jagunços, pistoleiros e cangaceiros da região de cada estrutura, sede, onde o mesmo fora montado. Logicamente que ao enviar as pessoas determinadas para a formação de tais batalhões o governo federal ‘patrocina’ os mesmos com dinheiro, armas, munição e vestimentas. Ricos em conhecimento das regiões em que moravam, conhecedores dos adornos geográficos e com experiência em guerrilhas, Guerra de Movimentos, aptos no manejo das armas, o que usavam para desviarem-se, confundirem e combaterem as Forças Públicas que os perseguia, os bandos de cangaceiros foram ‘convocados’ por Floro Bartolomeu, nisso, o chefe cangaceiro Lampião e seu bando, também, são chamados para ‘combaterem’ os “Revoltosos” pelo comandante do Batalhão Patriótico de Juazeiro do Norte – CE.
Floro Bartolomeu redige uma missiva e a encaminha ao chefe cangaceiro Virgolino Ferreira, Lampião, o convocando a fazer parte das fileiras das tropas do Batalhão Patriótico. Alguns autores referem que, sabedor da desconfiança de Lampião, além da sua assinatura, na carta constava a assinatura do sacerdote de Juazeiro do Norte, CE, a qual Lampião tem a certeza ao mostra-la a determinado ‘coronel’ coiteiro entre as cidades de Belmonte e Exu, ambas em Pernambuco. Temos que lembrar que não havia o serviço dos Correios e Telégrafos como hoje. A carta foi levada em mãos e o portador seguiu a pé e/ou a passos de um animal. O tempo levado para que a ‘convocação’ chegasse às mãos de Lampião, esse averiguasse sua autenticidade e o tempo que levou para deslocar-se do Vale do Pajeú das Flores, PE, com seu bando, e chegassem às imediações da “Meca do Sertão”, foi longo. Para azar de Virgolino, ou para sorte da história, ao chegar à localidade Lampião não tem como encontrar-se com seu convocador. Floro Bartolomeu, dias antes da sua chegada, adoece e segue para a Capital do país, Rio de Janeiro, a fim de tratar-se. Não cura-se, a doença lhe mata e ele é sepultado naquela metrópole com honrarias de general.
Os acontecimentos ocorridos em seguida referem—se às famosas patentes de “capitão”, “1º e 2º tenentes”, “provisórios”, do Batalhão Patriótico de Juazeiro do Norte recebida por Virgolino Ferreira, Sabino das Abóboras e Antônio Ferreira, respectivamente. Porém, a que mais chamou, e chama, atenção é a patente, mesmo provisória, de capitão que Lampião recebeu. Essa é motivo de discórdia ainda hoje entre pesquisadores, estudiosos e leitores do fenômeno.
Vamos aos fatos:
O pernambucano Pedro de Albuquerque Uchôa, funcionário público federal que fazia parte do quadro dos prestadores de serviço do então Ministério da Agricultura, Indústria e Comercio, no Estado do Ceará, entra na historiografia cangaceira a partir desse momento. Ele mesmo narra, já morando na capital do país e exercendo funções em outro departamento, em vasta entrevista como tudo aconteceu. “Através da reprodução das páginas de um vespertino carioca, apresentadas na primeira página do jornal sergipano “Diário da Tarde”, de sexta-feira, 29 de setembro de 1933, vamos encontrar o funcionário público Uchôa, aparentemente vivendo na antiga Capital Federal. Pela descrição no jornal, tudo indica que ele não era mais um membro dos quadros do então Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio. Era apresentado pelo jornal como funcionário da “Secretaria do Tribunal”, sem especificar se era um tribunal ligado a justiça Estadual ou Federal.” (Tok de http://xn--histria-o0a.com/ - Rostand Medeiros)
“Sobre os acontecimentos de 4 de março de 1926, Uchôa não narra o que aconteceu antes da chegada de Lampião, mas informa que nesta noite foi acordado por dois “jagunços”, em um sobradinho onde morava com seu contraparente, o cantador João Mendes de Oliveira.
Os homens intimaram o funcionário público, afirmando autoritariamente que “-Meu padrinho está chamando o Senhor com urgência”. Uchôa não perdeu tempo e foi logo a casa do Padre Cícero.
Segundo sua narrativa, estes dois homens portavam fuzis a tiracolo, estavam encourados e cheios de “medalhas”. As medalhas no caso, certamente seriam imagens de santos penduradas no peito. Ao escritor Leonardo Mota, Uchôa afirmou que estes homens eram Sabino Gomes e o irmão de Lampião, Antônio Ferreira.
Ao chegar à residência do líder de Juazeiro, o Padre Cícero lhe apresentou Lampião e disse, conforme está reproduzido no velho jornal sergipano de 1933.
“- Aqui está o capitão Virgulino Ferreira. Ele não é mais bandido. Veio com cinquenta e dois homens para combater os revoltosos e vai ser promovido a capitão. Olhe, o senhor vai fazer a patente de capitão do Sr. Virgulino Ferreira e a de tenente do seu irmão”.
Evidentemente que Uchôa ficou pasmo, “perplexo” em suas palavras.
Fiquei imaginando a cara do pobre coitado do funcionário do Ministério da Agricultura, acordado no meio da noite com esta bomba na mão. Ele ainda tentou argumentar que não podia, mas um dos irmãos de Lampião ponderou na hora.
“- Não, se meu padrinho está mandando o senhor pode”.
O Padre Cícero lhe colocou na condição de “mais alta autoridade federal de Juazeiro” e aí não teve jeito. Com o carismático prefeito ditando os documentos, foram “lavradas” as designações de patente.
Segundo Uchôa comentou ao repórter, parte dos termos do documento referente a patente de Lampião foram; “Pelo Governo Federal era concedido a Virgulino Ferreira a patente de capitão do Exército, por serviços prestados a República”.
Depois o Padre Cícero foi categórico e ordenou a Uchôa um curto “assine”. Ele colocou a sua firma no controverso documento.
Interessante é que em nenhum momento na reportagem, Uchôa pronuncia que concedeu uma patente a um dos mais cruéis e sanguinolentos bandidos de Lampião, o famigerado Sabino.
Após os “trâmites burocráticos”, Uchôa afirma que presenciou o temível Lampião, todo equipado, se ajoelhar reverentemente e beijar emocionado a batina do Padre Cícero. Lampião informou ao Padre que se comprometia a “proceder bem”…..
Uchoa informou ainda que após o encontro destas duas figuras, Lampião e seus homens receberam suas armas, munições e partiram no meio da noite.
Se assim foi, este foi o último ato da visita de Lampião e seu bando a Juazeiro.” (Tok de http://xn--histria-o0a.com/)
Findando esse acontecimento, vamos começar a analisar a força, poder de fogo, com que os bandos de cangaceiros, após receberem as armas moderníssimas e farta munição, o que tinha de melhor para a época, ficaram.
Baseando-se apenas no bando de Lampião, que até março de 1926 usavam rifles Winchester, modelo 1873, calibre 40 cano octagonal. Conhecido como “Rifle Papo Amarelo”.
Em seguida aquela data, o próximo registro fotográfico nos mostra o chefe cangaceiro Virgolino, o “Lampião”, e seu irmão mais velho, Antônio Ferreira, o “Esperança”, portando, aparentemente, Mosquetões Clavinas 1895 ou Mosquetão Mauser 1895.
Em outro registro fotográfico da época, voltamos a ver Lampião e Esperança com seus mosquetões e parte do bando usando Fuzil Mauser modelo.
Apesar da aparência mostrada nas armas serem mosquetões ou Clavinas mauser 1895, Federico Pernambucano de Mello, em seu livro Guerreiros do Sol, 5ª edição, pg 407, frisa que “Lampião e Esperança usam mosquetões Mauser 1895”.
Já o especialista em armas de fogo, Fabio Carvalho , assim explanou sobre as armas que portão os cangaceiros "Lampião" e "Esperança":
"Evidente que não se pode avaliar a quantidade de fuzis cedidos a Lampião e bando. Mas certamente não eram Comblain. Estes só portavam UM cartucho, já sendo plenamente obsoletos em 1920, perdendo para as Winchester em termos de velocidade de disparo ( mas não em potência, pois era superior).
As fotos de lampião e irmão mostram pelo menos uma clavina mauser 1895."
Fonte/foto: blogs, sites e livros citados, pinterest.com
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