*Rangel Alves da Costa
Os mais velhos me diziam... Oh quanta coisa maravilhosa os mais velhos me diziam...
E quanta coisa eu ainda quero ouvir antes que me torne apenas um velho esperando que alguém chegue para ouvir minhas memórias distantes.
Eu sempre gostei das palavras antigas, das vozes envelhecidas, dos dizeres de baús e relembranças carcomidas de tempo.
Memórias cheias de teias de aranha, proseados desgastados de estrada, assuntos empoeirados e ditos enferrujados.
Olhares que me miram como se o cansaço das vistas pouco reconhecessem o que sou e o que faço ali.
E descobri que quase nada sou, mas tudo passo a ser quando uma pergunta desponta: Você é filho de Alcino?
Quando respondo que sou, então tudo muda. Então a colcha de retalhos é aberta e os pedaços costurados surgem em cores maravilhosas.
E então os causos e causos retomam seu lugar no mundo para dizer do passado, de um tempo muito diferente daquele vivenciado.
“Já fui vaqueiro, mas de um tempo de cavalo tangendo boiada, e de passar três dias no meio do mato caçando uma rês teimosa...”.
“Já comi olho de macambira e bebi da água juntada em folha grande no meio do mato...”.
“Já fui perguntado por volante se eu ajudava cangaceiro, e então eu tinha que mentir. Dizia que não ajudava, quando ajudava sim...”.
“Já avistei cobra já de bote pronto na beira da estrada, então me lembrei de uma reza forte que minha avó me ensinou e fiz a bicha ficar parada lá feito pedra...”.
“Cavei cacimba e dividi com o bicho a mesma caneca. Sede não se mata com água de cacimba, mas a gente vai enganando a morte pela precisão de beber...”.
“Dizem que café quente com chuvisco num dá certo não, pois estupora. Mas dá certo sim, bastando se benzer depois de abrir a porta pra sair...”.
“É verdade essa história de que caipora castiga quem entra no mato sem levar pedaço de fumo. Eu nunca fui castigado não, pois com essas coisas eu nunca brinquei e em toda caçada que fazia eu levava o desejo da mata. Mas conheço gente que não só tomou relepada sem saber de quem apanhava como ficou sem saber tomar o caminho de casa...”.
“No meio do mato ninguém nunca tá sozinho não. Sempre tem um olho desconhecido vigiando cada passo que dá...”.
“Certa vez, dei uma relepada num lobisomem e no outro avistei a mesma relepada no ombro de Totoinho Torquato. O lobisomem era ele...”.
E assim vou ouvindo histórias, causos e proseados, e assim vou enchendo meu embornal desses frutos cultivados nos doces campos do tempo.
Escritor
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