Por Carlos Alberto Nascimento de Andrade
Inaugurado em
1928, o Estádio Juvenal Lamartine (JL), localizado em Natal-RN, palco de
grandes eventos relacionados ao esporte bretão está ameaçado de desaparecer.
Submetido a um intenso fogo cruzado por parte de redes organizadas, nos últimos
meses o vetusto estádio encravado no Bairro do Tirol tem pautado as matérias
futebolísticas veiculadas pela imprensa potiguar, todavia tais matérias carecem
de um viés crítico e distanciado das reais motivações dos argumentos que
reivindicam sobre a necessidade de se permutar este logradouro público por uma
área distante de sua atual localização. Mesmo de forma solitária e mesmo sendo
uma tarefa inglória, pois estamos mexendo num vespeiro de interesses escusos,
este é o objetivo central deste texto: argüir de forma ilibada sobre a
necessidade histórica, ambiental e identitária para a preservação do JL.
Dossiê das
acusações contra o Estádio Juvenal Lamartine e as razões para sua preservação
Os argumentos
mobilizados pelos que defendem sobre a necessidade de se permutar a atual área
do JL por outra em local longínquo (na Zona Norte) são indefensáveis e
insustentáveis. Vejamos alguns deles: argumentam que o JL não possui
estacionamento. É preciso lembrar que temos dois grandes estádios em Natal, o
Frasqueirão e o atual Machadão (futuro Arena das Dunas), e provavelmente vamos
ter um terceiro que será o Estádio do América (Arena do Dragão). Neste sentido,
o JL será uma praça de esportes voltada fundamentalmente para o esporte amador,
onde ABC, América e Alecrim mandarão seus jogos pelas categorias amadoras.
Apenas pequenos jogos de profissionais serão realizado neste local, como por
exemplo: Alecrim X Potiguar, América X Baraúnas etc. Com efeito, não vamos ter
grandes contingentes de torcedores com automóveis estacionados naquelas
imediações. Contudo, para os afeitos ao argumento que o JL não tem condições de
possuir um estacionamento próprio, informo que o Estádio Presidente Vargas em
Fortaleza, reformado recentemente, não possui estacionamento, e as ruas que o
circundam têm dimensões bem menores do que áquelas adjacentes ao JL. Idem para
o Estádio da Graça em João Pessoa, reformado também recentemente. E o que dizer
do Frasqueirão, como fica o estacionamento em dias de grandes jogos? E os
Aflitos? E o Pacaembu?...
Argumentam que o campo de jogo não atende as determinações e exigências da
FIFA. Realmente, se considerado o que existe no momento não atende, todavia sua
reforma deve contemplar tais exigências, esta é uma das atribuições das
técnicas de engenharia, foi isto que fizeram com o Estádio Leonardo Vinagre da
Silveira, conhecido como Estádio da Graça, localizado em João Pessoa-PB, que
atualmente sedia jogos do campeonato paraibano.
Argumentam que o JL não tem utilidade. Este conceito de utilidade é
reducionista, pois está restrito única e exclusivamente ao futebol profissional.
O que seria do futebol profissional se não fosse o futebol amador? Simplesmente
não existiria. 100% do jogador profissional tem sua origem no futebol amador,
seja nas categorias de base dos clubes ou nos “times de várzea”. Além de
pequenos jogos do futebol profissional o JL estará apto para sediar os
seguintes campeonatos: infantil, juniores, sub-15, sub-17, sub-20, 2ª divisão,
campeonato de futebol feminino. Para além dessas modalidades, também poderá
servir aos alunos das escolas estaduais, como palco para treinamento e como
espaço para a realização dos Jogos Escolares do Rio Grande do Norte – JERNS,
patrocinado pela Secretaria de Estado da Educação e da Cultura. É preciso
reter, que em função da especulação imobiliária os “campinhos de Várzeas” estão
praticamente em extinção.
Como conseqüência do anterior, argumentam que a prioridade para o Governo do
Estado é a construção de um Hospital na Zona Oeste de Natal, por isso defendem
a permuta do JL pela construção deste hospital. Uma coisa não elimina a outra.
Estamos todos de acordo que Natal carece de mais um hospital público,
entretanto se realmente esta é uma prioridade da atual gestão do Executivo
Estadual, e o governo alega não ter recursos para tal investimento, isto não
poderá ser à custa de uma permuta com o JL. O Governo do Estado possui vários
imóveis que não se encontram com uso público adequado e que podem perfeitamente
servir de “moeda de troca” para a referida construção, com por exemplo, o
terreno onde se encontra o Aeroclube de Natal encravado numa das áreas mais
nobres da cidade, o bairro do Tirol. Esclareço que não estamos sugerindo esta
permuta, apenas estamos apresentando um exemplo. Com certeza o governo possui
outros imóveis que estão ociosos e que poderão perfeitamente servir para esta
finalidade.
Em outra perspectiva, a preservação do JL contribui para a afirmação de valores
locais como meio de resistência a valores globais alienígenas, como a cultura
“neocolonizadora” da identificação do torcedor local com clubes,
principalmente, de São Paulo e Rio de Janeiro. Pesquisa recente, publicada pela
imprensa escrita local, mostrou que apenas 11% do torcedor potiguar frequenta nossos estádios de futebol. O motivo é a falta de identidade com nossos clubes.
Vários fatores contribuem para que isso ocorra: transmissão abusiva pela
televisão de jogos de futebol, sobretudo do eixo Rio de Janeiro e São Paulo nos
mesmos horários dos jogos de nosso Campeonato Estadual; imprensa falada,
escrita e televisada que dedica maior parte de seu noticiário para fatos
esportivos relacionados com estes dois estados da federação. A propósito,
citamos um caso emblemático e absurdo: recentemente o Alecrim foi jogar em
Recife contra o Santa Cruz pernambucano, numa partida que era de “vida ou
morte” para as pretensões esmeraldina, pois caso o Alecrim vencesse a partida
prosseguiria na Série D rumo a C. Pois que, a Rádio Globo de Natal, ex-Rádio
Cabugi (parece sintomática a mudança de nome), ignorou este jogo e simplesmente
retransmitiu pelo seu prefixo a partida entre Botafogo X Flamengo.
Diante deste quadro, a luta pela reconstrução da identidade cultural local
contribui decisivamente para a elevação da auto-estima, consequentemente ao
agir de forma independente e com autonomia o indivíduo poderá operar maiores
resistências à valores que não estão relacionados com seu cotidiano. Neste
sentido, a preservação do JL contribui com a identidade do torcedor com os
clubes potiguares e com a história de sua cidade.
Carlos Alberto
Nascimento de Andrade. Professor do Departamento de Educação da
Universidade do Estado do Rio Grande do Norte - UERN
Enviado
pelo professor, escritor, pesquisador do cangaço e gonzagueano José Romero de
Araújo Cardoso
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
http://josemendespereirapotiguar.blogspot.com.br
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